terça-feira, 30 de junho de 2009

Olá amigos !!!

Cap. 11 postado.

E como eu percebi que algumas pessoas que acompanham o blog gostam tanto quanto eu de musica celta e new age , vou postar um vídeo de uma banda irlandesa que eu adoro, Celtic Woman. Esta musica esta na playlist , pois eu a ouvi muito quando visualizei este capitulo, escutem a voz maravilhosa da vocalista, e me digam se ele não te transporta para um mundo aonde a magia é possivel.

Um beijo a todos !!!! Cheio de magias perfumadas.

Gaby

Cap. 11 - A era das revelações

Apesar de eu passar em frente da casa de Danielle todos os dias naquela semana, no fundo eu imaginava que, a casa dela por dentro seria diferente.

Eu imaginava uma casa cheia de velas e incensos, um sofá velho, de couro escuro com um grande gato em cima, e quem sabe até algum caldeirão.

Claro, tudo muito clichê, mas eu não imaginava algo diferente. Eu tinha consciência do meu horror aos rótulos, mas eu ainda não estava preparada para uma amiga bruxa.

A sua casa era simples, mas sofisticada, decorada em tons pastel, moveis finos e de bom gosto, tudo muito clean e iluminado. Alguns quadros de arte moderna na parede, iluminados com luz fria, como eu já havia visto nas revistas de decoração de minha mãe.

Quanto aos pais de Danielle, eu jamais poderia ter imaginado pessoas mais diferentes. A mãe dela era médica, educada e polida. Era baixinha como Dann e tinha os mesmos cabelos cacheados, mas cortados curtos. O pai era um senhor grisalho e sério, era advogado, e pelo o que Danielle havia me contado, ele foi advogado dos Nicholls por muitos anos.

Mas era como se algo estivesse errado, pois eles eram tão sérios e disciplinados. Claro que eles eram muito educados e receptivos, mas aquela aura distante não combinava com Danielle. Eu não sei, eu no fundo achava que todos os pais deveriam ser como os meus. Eu sabia que eu tinha muita sorte.

Após alguns minutos, estávamos no quarto de Danielle. Era grande, quase o dobro do meu, e a decoração seguia o mesmo estilo do resto da casa.

Uma grande cama de ferro, cortinas e tapetes pastéis, varias fotos de família na parede. Mas tirando isso, todo o resto parecia com ela.

Seu computador estava jogado em cima da cama, ainda ligado, com vários livros e papeis em volta. Tinha um enorme sino dos ventos na janela, fazendo um agradável barulho conforme a brisa batia e uma taça de cristal cheia de água em cima do parapeito. Foi então que eu percebi que Ela tinha uma varanda e ali havia feito um jardim de inverno, com uma enorme quantidade de plantas em vasos e jardineiras, todas com plaquinhas de papel servindo como indicação. Em cima do tapete da varanda, ao que parecia,um altar. Daqueles que eu já havia visto em filmes, velas , potinho com sal e terra , um punhal e um incensários.

Assim que chegamos, ela acendeu e atiçou um pequeno carvão, jogando algumas ervas por cima. Logo a fumaça tomou conta do quarto e eu pensei que fosse sufocar. Mas isso não aconteceu, pelo contrario, o delicioso cheiro da erva queimando me deu uma enorme sensação de paz. Eu logo reconheci o cheiro, era lavanda.

Caminhei ao redor do seu quarto, analisando cada detalhe, cada pedra de cristal e ri muito quando encontrei um caldeirão. Destes, de ferro fundido, enorme e negro.

Ela estava ali, parada na porta, a mascara calma de volta em seu rosto.

- Hey – eu disse entre risos – você tem certeza que eu não vou encontrar asas de morcego, ou dentes de dragão, ou mesmo uma língua de lagarto dentro deste caldeirão?

Ela deu um longo suspiro, jogou a enorme mochila em um canto do quarto e caminhou até minha direção.

- Oh, eu nunca vou me cansar da velha piadinha da bruxa e seus encantamentos. Obrigada Nicolle.

- Você esta chateada com meu comentário ? – eu perguntei, fitando o seu rosto em busca de algum sinal de mágoa. Eu não queria chatea-la com comentários sobre o que ela acreditava.

Ela pensou por alguns instantes e pegou a minha mão, me puxando em direção a sua varanda.

- Na realidade não. Não estou chateada. – então ela apontou para várias plantinhas – Ali esta, dente de dragão, unha de gato, olhos de salamandra... As antigas bruxas davam estes tipos de nomes a ervas para que elas não fossem reconhecidas e seus encantamentos continuassem em segredo. Então cada nome nojento desses, que fazia qualquer criança se revirar na cama, na realidade é um código para alguma planta, erva ou condimento. Nada, além disso.

Eu não imaginava nada assim. Gostei da linha de raciocínio das antigas bruxas.

Foi então que eu vi a foto de um garoto na parede de Danielle. Parecia com ela, em versão masculina e mais velha.

- Quem é ele? – eu apontei para o retrato na parede.

- Meu irmão, Kyle. Ele tem vinte e um agora.

- E aonde ele esta?

- Marinha – ela disse pensativa – sinto falta dele. As coisas eram um pouco diferentes quando ele ainda estava em casa.

- Por quê?

- Você conheceu meus pais Nicolle. Eles sempre estão preocupados com suas próprias coisas e o trabalho de ambos os consome . Com meu irmão, sempre tínhamos a companhia um do outro. Quando ele partiu, foi bem dolorido. Mas ainda mantemos contato, o sistema de comunicação on line da marinha funciona.

- Deve ser bom ter irmãos. Quando eu era mais nova, eu sonhava com um irmão, ou mesmo uma irmã.

- Você é filha única.

- Sim. – eu disse.

- Bom, se uma amiga resolver seu problema, aqui estou eu – ela disse levantando os braços , como uma garotinha.

Eu ri.

- Obrigada – eu disse – e você pode contar comigo também.

Ela me deu um rápido abraço e correu em direção ao seu closed. E olha, eu tinha que dizer, era bem grande e eu ficaria imensamente feliz com um daqueles no meu quarto. Ela voltou com vários potinhos de plásticos cheios de alguma coisa dentro. Eu acho que eram ervas ressecadas.

- Aqui – ela disse me entregando um dos potinhos – o resultado de minha pesquisa sobre insônia . Recolhi algumas ervas, com efeito acalmante – então ela me entregou uma pequena trouxinha de tecido branca e muito perfumado– e esse aqui é um saquinho de lavanda , para você usar embaixo do travesseiro. Com isso e alguns rituais, acho que podemos resolver seu problema.

Eu já havia ouvido aquilo,eu tinha certeza sobre isso. Busquei em minha mente e lembrei-me de minha avó, pois sempre que eu estava um pouco resfriada ou com cólica, ela colocava algumas florzinhas de camomila na banheira, e pedia para eu ficar ali, quietinha, sentindo o calor da água. E sempre dava certo, mas eu nunca dei muita importância. Agora parecia mais sério para mim. Por mais que eu achasse absurdas todas aquelas coisas que Danielle acreditava eu absorvia cada informação, como se realmente elas pudessem me ajudar.

Eu estava tão desesperada para ter um pouco de paz, que tentaria qualquer coisa, isso eu tinha certeza.

Foi então que eu percebi Danielle toda agitada, trocando os lençóis de sua cama, enquanto puxava uma cama de hospedes, que ficava debaixo da sua, indo varias e várias vezes ao seu banheiro, carregando um monte de potinhos em seus braços.

- Você quer ajuda? – eu perguntei.

- Não, você vai tomar um banho agora. A banheira já esta cheia, e, por favor, só saia de lá quando se sentir muito, mas muito relaxada.

Foi o que eu fiz. Peguei meu pijama e minha nécessaire na mochila que eu havia trazido. E fui direto para o banheiro de Danielle.

Quando eu entrei, percebi que o banheiro dela era duas vezes maior que o meu. E era rosa, azulejos e louça, tudo em vários tons de rosa perfeitamente combinando. E claro, vários vasinhos de flores estavam espalhados em todos os lugares.

Foi então que eu vi o fruto da agitação de Danielle. Ela havia colocado uma música, dessas de relaxamento em um player que ficava ao lado de sua banheira. Um incenso suave queimava, e algumas velas de tonalidades delicadas também estavam acesas. Olhei para a banheira e varias ervas flutuavam na água.

Ela havia colocado um bilhete ao lado da banheira.

“Não se esqueça, nada de sair enquanto não estiver bem tranqüila e relaxada. Qualquer problema, grite, estou aqui ao lado. Dann “

Eu segurei o bilhete entre as minhas mãos e o apertei. Senti uma total e completa amizade por Danielle. Mal nos conhecíamos, e aqui estava ela, tentando me ajudar, com todo seu jeitinho diferente.

Rapidamente tirei a minha roupa e entrei na banheira. A água estava quentinha e cheirosa, emanando uma onda de tranqüilidade em cada músculo tenso de meu corpo.

Eu sabia que precisava limpar a minha mente de todo e qualquer pensamento, mas naquele momento, lembrei de todos os acontecimentos daquela semana. Desde o meu primeiro dia no colégio, aos meus pesadelos que pioravam a cada dia, as minhas noites insones e meu medo de que eu estivesse perdendo a sanidade. Lembrei do perseguidor loiro que tanto me amedrontou e do homem jovem, de olhar bondoso.

Pensei em meus novos amigos, em Jack e ao carinho que ele demonstrava por mim, de uma forma que eu sabia que não estava pronta para retribuir. Lembrei da raiva não contida que eu sentia por Jéssica e sua assecla de bronzeadas e metidas. Aquele mundo de aparências que não era o meu mundo, não era a forma com a qual eu sabia viver.

Foi então que eu me lembrei de meu ultimo sonho, tão vívido e dolorido, aquela sensação de perda e solidão que apertava o meu coração , e me enchia de tristeza. Lembrei do caos que eu sentia, vendo as tochas chegando cada vez mais perto. E depois de todo o caos, eu lembrei, finalmente do encontro com Henry Nicholls na praia, aquela mistura de nervosismo e paz que eu senti ao estar com ele. Eu senti minha pele formigando ao lembrar do calor de seu toque , da intensidade de seus olhos azuis e do seu lindo sorriso.

Sim, eu tinha certeza que eu estava sendo patética completamente patética ao pensar sobre ele dessa forma. Eu havia deixado o seu livro guardado na gaveta do meu criado mudo, e nem sequer tinha aberto alguma de suas paginas.

A água morna fazia meu corpo ficar mais e mais relaxada, e eu sentia cada batida daquela musica relaxante entrando por meus ouvidos e chegando até cada um de meus músculos. Eu estava leve, tão leve, que meus olhos estavam começando a ficar pesados. As chamas das delicadas velas dançavam em espiral, um lindo balé que atraia os meus olhos. Era como se aquelas chamas estivessem dançando para mim, para meus olhos, fazendo que eu levantasse minha mão com vontade de tocar aquela chama. Mas eu não conseguia levantar minhas mãos, elas estavam tão leves que não obedeciam ao meu comando.

Eu sabia que estava perdendo algo, alguma amarra que resolveria todos aqueles problemas, mas não agora. Eu queria apenas fechar os meus olhos, e eu sabia que nada de errado aconteceria ali, no banheiro de Danielle, como por exemplo, eu me afogar em sua banheira. Sim, soava ridículo, mas nos últimos dias eu poderia esperar qualquer coisa de mim mesma.

Tantas perguntas em minha mente, qual seria a chave daquele mistério?

Eu fechei meus olhos. O cheiro doce de lavanda entrava por meu nariz. Aquele cheiro estava por todos os lados. Aquilo estava errado. Então eu abri os meus olhos, e quando olhei em volta, eu estava correndo em um campo.

Um lindo campo lavanda, lavanda por todos os lados, até aonde eu não poderia mais enxergar. O horizonte era lavanda, cintilando a luz do sol. Lavanda como a cor da túnica de algodão que eu vestia.

Uma voz doce de mulher cantava ao fundo. Eu sabia que deveria ir ao encontro dela. A voz era tão doce, que me abraçava, e eu tinha aquela sensação de voltar para casa, após uma longa viagem.

Eu quis correr e correr e correr. Mas então eu tive medo. A ultima vez que isso tinha acontecido não havia sido bom, pois eu havia encontrado aquele homem, a raiva brilhando em seus olhos, aquelas mãos que queriam me tornar cativa. Não, eu não poderia continuar. Eu parei ali onde estava e fechei meus olhos com força.

Acordei assustada na banheira de Danielle. Eu havia dormido por quanto tempo?

Sai apressada da banheira e me sequei meio que superficialmente, e em um salto já estava usando meu pijama e já tinha escovado os meus cabelos.

Mas eu ainda estava com sono, meus olhos estavam pesados, meus músculos entorpecidos.

Quando eu voltei ao seu quarto, as camas estavam prontas, ela havia acendido alguma velas também. Era o mesmo cheiro de lavanda, por todos os lados.

Ela estava em sua varanda com uma grande taça de cristal e uma pequena bacia nas mãos quando me viu.

- Hey – ela disse, levantando os olhos – eu já estava preparada para invadir o banheiro a qualquer momento se você não voltasse logo.

- Eu demorei muito? – eu disse meio que bocejando. Ela riu.

- Quase meia hora. Vejo que deu resultado, você esta caindo aos pedaços de sono.

- Eu estou bem – eu disse com a voz pesada – eu estou ótima. Você... você quer conversar ?

- Claro que eu quero, mas com uma amiga viva, e não uma desmaiando pelos cantos. – então ela estendeu á mão em minha direção – Venha cá, vamos tentar resolver este seu problema.

- Este é um ritual para abrir os seus olhos e sua mente, para que você veja os seus problemas e as soluções com clareza. Não ria, por favor, isso é sério e eu tenho certeza que vai te ajudar, e eu farei contigo. A água, é a fonte da vida, é aquela que nutre e limpa. Algumas lendas dizem que a água é o sangue da grande Mãe, a Deusa. Neste ritual, lavaremos os olhos para que possamos enxergar a realidade.

Eu fiquei bem quieta ouvindo a sua explicação. Ela era tão pequena, mas ao dizer aquelas palavras ela era grande, grande e sábia, e eu tinha respeito pelas convicções dela, apesar de não acreditar. A verdade saia em suas palavras. Eu queria ter aquele tipo de fé que ela tinha, em alguma coisa.

- Você se importa se fizermos uma oração á Deusa? – ela perguntou timidamente.

- Não, eu não me importo. – e eu estava dizendo a verdade.

Então ela me entregou a bacia prateada, e elevou a taça, em direção ao céu.

- Mãe, Deusa encantada dos bosques e das florestas, tu que estas presente no ar que respiramos, na terra que pisamos, no fogo que nos acalenta e nos protege e na água que nos alimenta , esteja presente aqui , neste quarto. Pedimos-lhe para que o véu da noite seja rompido de nossos olhos, e que possamos enxergar a realidade que esta oculta de nós. Peço-lhe gentilmente, que ajude minha amiga Nicolle, a encontrar o seu caminho, longe do medo e das preocupações. Proteja e vele o seu sono, minha Mãe, tirando toda a escuridão de seu redor. – então ela deu um pequeno sorriso para mim – Que assim seja e assim se faça.

Aquelas palavras tão sinceras e cheias de emoção tomaram conta de mim, tão profundamente que eu nem percebi que ela estava esperando que eu respondesse alguma coisa. Eu disse a primeira coisa que veio em minha mente.

- Que assim seja e assim se faça. – eu repeti.

Ela ficou toda alegre e estendeu a taça em minha direção, jogando um pouco de água na bacia que eu segurava.

- Lave os seus olhos – ela pediu – esta água foi banhada pela luz da lua cheia, em meu ultimo Esbath. Peça a Deusa que ilumine seus olhos, e que toda a verdade que você deseja seja revelada. Peça a chave de seus problemas, seja eles quais forem.

- O que é um Esbath? – eu perguntei, com a voz ainda carregada pelo cansaço.

- É um ritual feito na lua cheia. Em vez de uivar para a lua, como as garotas lhe disseram, as bruxas celebram a passagem da lua cheia. Isso é um Esbath. Agora faça o ritual, por favor.

Fiz o que ela pediu, sem ao menos questionar. Molhei as minhas mãos na bacia e levei a água na direção dos meus olhos, pedindo exatamente aquilo que ela me dizia – a verdade, a chave de todas aquelas noites insones, e da estranheza da minha vida, nos últimos tempos. Sim, eu não era exatamente muito normal desde os meus dezesseis anos, mas aquela ultima semana havia sido o ápice do caos. Em seguida Danielle fez o mesmo, seus olhos sérios, apesar de brilharem intensamente, um sorriso tranqüilo em seus lábios.

Eu bocejei mais uma vez, o sono dominando todos os meus sentidos.

- Hora de dormir – Danielle afirmou, enquanto eu me dirigia inconscientemente para a cama de hospedes.

- Não – ela disse segurando o meu braço – você dorme na minha cama, eu fico com a de hospedes.

- Não – eu tentei questionar – não, eu durmo na de hospedes, não precisa fazer isso Dann.

Ela negou com a cabeça, me empurrando em direção da sua cama.

- Não, ela já esta arrumada para você – ela apontou para um círculo tecido em linha , em formas espirais e algumas penas pendendo de sua base , que estava bem em cima da cabeceira da cama – ali, um filtro dos sonhos , para garantir que seus pesadelos fiquem longe de você. E embaixo do travesseiro, um saquinho de alfazema para atrair tranqüilidade e bons sonhos.

Eu quase não conseguia ouvir mais as suas palavras, e rapidamente me enrolei no edredom da cama de Danielle e fechei os meus olhos, quase sem sentir medo de fechar os meus olhos. Eu me sentia protegida, o doce cheiro da alfazema em todos os lugares daquele quarto.

- Boa noite Dann - eu disse, meio enrolando as palavras.

- Boa noite Nicolle. E eu espero ter bons sonhos mesmo, quem sabe sonhar com o Orlando Bloom em O Senhor dos Anéis.

Antes que eu pudesse registrar as palavras de Danielle, ou ao menos rir de seu gosto para caras, eu percebi que já estava inconsciente. Meu corpo já estava leve novamente, mas eu não estava completamente adormecida. Eu sentia o cheiro de alfazema, mas algo mais ao fundo. Eu ficava cada vez mais leve, mais e mais, e quando abri os olhos eu podia ver todo o quarto de Danielle, mas de outro ângulo, como se eu flutuasse, se o visse por cima. Aquilo me deixou com medo, muito medo, pois eu via a sua cama, via Dann deitada, mas de olhos abertos, lendo um livro iluminado pela chama de uma vela, com certeza com medo de me acordar.

As chamas das velas dançavam em espiral novamente, mas era diferente, como se as chamas formassem um espiral de luz, como uma porta, ou algo parecido. As sombras provocadas pelas velas estavam brincando com os meus olhos.

Olhei mais uma vez para baixo e fiquei meio apavorada ao perceber um montinho enrolado em cobertas, podendo ver apenas uma ponta de cabelos negros saindo pelas pontas. Oh meu Deus, aquela ali era eu, eu tinha certeza. Mas como eu conseguia me enxergar dormindo, se eu estava acordada e olhando tudo por cima?

Ah claro, aquele deveria ser o mais louco de todos os meus sonhos.Até o momento.

Aquela voz que eu havia ouvido momentos antes estava cantando novamente, doce e terna, me chamando em sua direção.

Eu fechei os olhos tentando controlar o pavor que eu sentia em ver meu corpo ali dormindo. Como isso seria possível?

Sim, eu devo ter perdido o que restava da minha sanidade.

A voz era tão hipnótica e eu desejei ardentemente ir em sua direção. “Vá até ela” algo sussurrava em minha mente.

Eu abri meus olhos e estava de volta ao campo de alfazemas. Dessa vez, eu corri em direção a voz, as flores em encontro á minha túnica de algodão, o sol iluminando a minha pele. Uma brisa suave agitava ainda mais o cheiro de alfazema e bagunçava os meus cabelos soltos.

A sensação era maravilhosa, e eu corria e corria desta vez me divertindo com a velocidade, era como se eu mal tocasse meus pés no solo. Eu flutuava. Ou eu seria tão veloz que meus pés não tocavam o chão?

Já que eu estava louca mesmo, ao menos podia me divertir um pouco.

Ao longe eu vi uma mulher, seus longos cabelos negros balançando ao vento, como as mangas de sua túnica branca. Ela não parecia real, a luz do sol a iluminava como uma pintura. Era ela quem cantava.

O vento se agitava ao seu redor como um redemoinho, mas era impossível, pois não havia destruição, apenas paz. Aquele redemoinho de repente veio em minha direção e me puxou em direção a mulher.

“Bem vinda Filha, seja bem vinda” – eu ouvia o vento sussurrar.

Mas meus olhos estavam fixos na mulher, de sua doce voz e da luz que emanava de seu corpo.

Então quando eu percebi eu estava a seus pés, sentada e sem fôlego.

Ela parou de cantar , e me fitou. Era impossível descrever a cor de olhos. Eu poderia dizer azuis, verdes, negros, ou uma infinidade de cores. Era a coisa mais linda que eu já havia visto em toda a minha vida.

Assim como ela. Era difícil dizer a sua idade, mas eu podia jurar que ela tinha a minha idade , talvez alguns anos a mais, se muito. Mas seus olhos, seus lábios , tudo dizia que ela era mais velha. Muito mais velha.Mais velha que meus pais. Ela tinha aquele olhar sábio e paciente que eu via em minha avó.

Ela sorriu para mim e me estendeu a mão, me ajudando a levantar.

O vento suave nos envolveu, como um manto. Eu queria tocar seu rosto, para descobrir se ela era real.

- Bem vinda, minha pequena criança – ela disse, sua voz soava como sinos em meus ouvidos – bem vinda minha filha. Eu a espero há muito tempo.

- Quem... quem é você ?– eu gaguejei.

- Eu tenho muitos nomes – ela disse o sorriso resplandecente aumentando em seus lábios – assim como eu tenho muitas faces. Sou a donzela, a mãe a anciã.

- Eu . Não. Entendo. – eu murmurei.

- Não ainda , minha pequena filha. Você se esqueceu , e eu entendo. Entendo tudo que você sofreu em nome de suas irmãs, de seu clã e em meu nome. Talvez seja a sua escolha iniciar novamente o seu Caminho.Sei que você esta confusa, minha querida filha, mas eu fico feliz que finalmente tenha vindo a mim.

Suas palavras fizeram a minha mente girar. Minha escolha? Minhas irmãs e meu clã? Eu me lembrei da noite passada e de meu sonho, da solidão pela perda do homem que era meu pai , pela minha irmã ferida. E uma outra dor ,a traição e a solidão que eu sentia por um homem, que eu não lembrava o rosto nem o nome. O que tudo aquilo queria dizer?

- Quem eu sou ? – eu perguntei a ela , levantando meu queixo no que poderia ser interpretado como uma afronta. Mas seus lábios mantinham o sorriso, apesar de seus olhos demonstrarem algo... como piedade. Por que ela tinha piedade de mim ?

- Uma Filha do vento, é isso que você é. Você é minha filha. E você não esta sozinha.Como deveria ser desde o começo, o caminho de vocês esta se cruzando. Abra os seus olhos e seu coração, criança, para o que você e suas irmãs são.

- Não – eu queria gritar – eu não tenho irmãs. Que loucura é essa ?

Então ela virou seus olhos para a esquerda, Eu acompanhei seu olhar e vi uma garota dormindo, os lindos cachos escuros de seus cabelos emoldurando seu rosto. Eu vi Danielle dormindo tranquilamente, em uma cama de palha, embaixo da copa de uma árvore. Ela não deveria estar dormindo em seu quarto? Não era ali que eu também deveria estar.

- Você não a conhece? – ela sussurrou.

- Claro que eu conheço. É minha amiga Danielle. O que afinal eu sou? O que você quer dizer com tudo isso?

Havia lágrimas em meus olhos, minha garganta estava seca. Quem era ela , quem eu era afinal?

- Uma sacerdotisa, uma bruxa – ela murmurou, levantando a sua mão e tocando de leve o meu rosto – dê o nome que seus ouvidos se acalmarem ao ouvir. Mas mantenha os seus olhos abertos, o tempo clama por vocês.

- Eu não sou uma bruxa – eu gritei, dando um salto para traz, ficando longe de seu toque e daquela sensação de paz que ele emanava pelo meu corpo – Eu sou apenas uma garota, não uma filha do vento ou sei lá o que. Me deixe em paz, se você não pode me ajudar.

O vento que nos envolvia se enfureceu fazia as nossas roupas se agitarem. Mas ela continuava calma, o carinho estava ali em seus olhos.

- Caminhe naquela direção, então e veja com seus próprios olhos. Este é o seu dom e o seu futuro. Apenas não se esqueça minha filha, não demore, o tempo clama. Vocês já se encontraram as minhas pequenas crianças. Agora se inicia a era das revelações de sua vida.É o seu destino.

O vento me empurrou sutilmente para a direita, para uma floresta fechada e um pouco escura. Eu queria voltar para trás, queria perguntar o que ela queria dizer, eu tinha mil perguntas. Mas a força do vento me compelia a correr para o caminho que ela apontava. Mas eu ainda ouvi a voz, a voz de sinos daquela mulher soando em meus ouvidos.

“Sempre confie em seu coração, pequena criança. Você nunca estará sozinha. Aceite as mãos que se estenderem em sua direção.E cuidado com as sombras.”

Eu estava correndo novamente, em direção a floresta, os galhos das árvores machucando o meu rosto. Conforme eu adentrava naquela floresta, a escuridão ia tomando, o dia se transformava em noite.

E eu corria , e corria e corria. Eu era veloz. Eu gostava de ser veloz. Eu era rápida como o vento.

Lá no fundo eu via uma chama dançando, iluminando aquela escuridão. Eu tinha medo de que , no fundo , eu voltasse aquele sonho e aquela solidão, mas não era isso que eu sentia.

Eu via pessoas ao fundo. Conforme eu me aproximava, aquelas pessoas iam ficando cada vez mais claras. Eram cinco pessoas, em volta de uma fogueira. Elas estavam de pé formando um circulo.

Eu me escondi atrás de uma árvore, temendo que elas me vissem.

Todos usavam um manto negro, cobertos com um capuz. Eu via apenas as mãos e cabelos soltos, caindo pelos ombros, os rostos olhando para baixo, ainda escondidos pelo capuz.

Eram quatro garotas e um homem. Isso era fácil perceber, pela forma de seus corpos, mesmo escondidos pelos pesados mantos.

As quatro garotas elevaram as mãos para os céus , e eu senti um tremor pela terra enquanto o vento se agitava e as chamas da fogueira ficaram mais vivas. Eu conseguia ouvir o barulho de água no fundo, como uma cachoeira ou ondas enfurecidas.

O homem tinha um cajado em sua mão. Ele se dirigiu ao centro, e eu ouvi a sua voz, clara e profunda.

- Filhas – ele disse – o poder nos chama. O amor nos une e nos seios de nossa Grande Mãe nos protegemos. Sacerdotisa do fogo, nos mostre o seu poder.

Uma garota se aproximou dele, o rosto ainda oculto pelo manto. Ela levou uma mão ao coração e a outra em direção ao fogo.

- Com amor e confiança dentro deste circulo – ela disse, a voz calma e melodiosa – eu peço a proteção e o amor para o nosso clã. Em nome da Deusa, eu me apresento.

Então a garota levantou o rosto e abaixou o seu capuz. Seus enormes olhos castanhos olharam diretamente para mim. Minha respiração ficou presa em meus pulmões e eu quase engasguei quando eu a vi. Ela levou as mãos em concha em minha direção. Foi então que uma explosão vermelha se deu bem em frente em meus olhos. A garota tinha fogo em suas mãos.

Eu queria gritar, ela ia se queimar, ela ficaria feriada, será que nenhum deles via o perigo?

Mas ela sorria. O fogo não a queimava, ele brotava da palma de suas mãos.

Eu engasguei. Um grito agudo ficou preso em minha garganta.

Pois a garota, com fogo nas mãos, era eu.

sábado, 27 de junho de 2009

Olá amigos!!!

Bom, uma pequena pausa antes do pròximo capitulo para falar de um assunto que eu amo: música.

Muitas pessoas que me conhecem sabem que, eu não vivo sem música.

E nem consigo escrever também, e algumas vezes eu me pego pensando em qual música meus personagens gostam, afinal a música mostra um pouquinho da personalidade de cada um, e acho que , a vida deveria ter uma trilha sonora.

Pois bem , como eu sou atrevida e sempre acabo falando alguma coisa por aqui, gostaria de dar uma dica sobre a cantora Hana Pestle. Ela escreveu uma música inspirada em Twilight( Crepusculo ) e a música é simplesmente maravilhosa. Estou aqui de dedinhos cruzados para que ela consiga entrar na trilha sonora de New Moon.

Vi este clipe no site do Foforks ( que eu adoro e acompanho ), e a voz dela é linda, lembra um pouco a Amy Lee do Evanescence.

E claro, gostaria de deixar também a minha tristeza pela morte do cantor Michael Jackson , com certeza o maior gênio da música moderna.Até meu filhinho de um ano e meio ontem começou a querer "andar para trás " ao ver os passos do moon walker na televisão. Adeus Michael e com certeza você estará vivo no coração de toda uma geração.

Beijos e Beijos

Gaby

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Queridos

Cap. 10 postado. Espero que todos estejam se divertindo e aproveitando a história.

Um beijo enorme em cada coração

Gaby

Cap. 10 - Comparações

Eu dei o meu mais zangado olhar para Danielle.

Mais uma vez.

- Aonde esta aquela historia de minutos atrás de que eu teria o meu tempo para contar os meus problemas e blábláblá? – eu perguntei.

Ela nem ao menos olhou em minha direção, já que tentava se entender com a direção do carro ecologicamente correto de sua mãe.

Aquilo começava a fazer meu sangue ferver e quase colocava em risco o meu bom humor adquirido naquele dia. Apesar dos meus olhos estarem pesados como se grãos de areia estivessem coladas em minha retina.

Claro que eu ainda sentia aquela enorme necessidade de conversar com ela e expor os meus sentimentos e problemas. Mas as súbitas mudanças de humor de Danielle me deixavam a maioria das vezes muito irritada. Era difícil entender as atitudes bipolares dela.

Mas o mais difícil era andar de carro com Danielle como motorista , já que ela conseguia transformar um caminho de pouco mais de cinco minutos em uma jornada de quase meia hora, pois além de ela dirigir a uma velocidade que deixaria qualquer vovozinha de oitenta anos bem estressada – de tédio - ela ainda contemplava cada avezinha ou árvore pelo caminho. Por duas vezes ela havia feito uma oração pedindo desculpas a alguma árvore por ter machucado as suas folhas. Sério, ela havia feito isso.

- Dann, eu estou falando com você – eu repetia pela enésima vez desde que saímos da minha casa – e eu quero conversar sobre aquelas garotas que conhecemos ontem. Eu tenho varias e várias perguntas.

- Eu também tenho, varias e várias perguntas – ela disse enquanto revirava os olhos – Ali, à esquerda. A Pat mora em Íbis.

Chegamos a uma rua toda arborizada, com algumas crianças brincando na calçada. A casa cinqüenta e nove era de Patrícia.

Ela nos esperava logo na porta, rindo com Hellen e Julliet, vidradas observando um cara latino, muito gato, que regava algumas plantas do outro lado da rua. Sem camisa, a pele morena e musculosa.

- Hey Dann, Nicolle, bem vindas ás portas do paraíso – ela apontou para o cara do outro lado da rua, nos cumprimentando do jeito típico da turma, batendo os pulsos e a mãos.

Não parecia mais estranho para mim.

- Ola garotas – eu disse – onde estão os garotos?

- Na marina de Júpiter – Patrícia deu de ombros – Hoje é dia de Regata Thonsom, e como os pais de Paul e Michel são engenheiros náuticos da companhia, estão todos lá.

Júpiter era uma província de Palm Beach, e ficava a poucas milhas de West Palm. Ao que eu sabia muitos dos reis de West Palm tinham residência lá.

O que eu não sabia era que, a empresa da família de Trevor Thonsom organizava uma regata com seu nome, muito menos que os pais de Michel e Paul eram seus funcionários. Só de ouvir o nome Thonsom, Danielle torceu o nariz. Ela realmente não gostava dele e eu queria saber de onde nasceu toda aquela antipatia.

Hellen se aproximou, segurando eu e Dann pelos braços.

- Vocês viram o novo vizinho da Pat? Oh, aquilo ali sim é quente – ela disse com as bochechas vermelhas – aposto que se ficarmos algum tempo aqui fora ele nos nota. Se bem que as únicas disponíveis aqui além de mim e a Julliet é você Dann. Já esta na hora, hein garota, de voltar ao mundo das vivas!

- As “únicas” disponíveis? - eu questionei.

- Ahã – ela confirmou – porque você pequena amiga novata, já esta na mira de nosso Jack e a Patrícia – ela deu uma leve cotovelada nela - tem namorado. Menos competição.

Eu tinha tanta coisa na minha cabeça naquele momento, que a única coisa que eu poderia pensar era em Jack ou no vizinho latino super sexy .

Ficamos ali fora, conversando sobre toda e qualquer coisa banal que se podia imaginar. Se bem que eu estava gostando, era sempre bom ter conversas um pouco normais, já que a ultima coisa que eu estava sendo era normal. Mesmo Danielle se comportava de forma mais tranqüila quando estava na presença das outras garotas. Aparentemente, somente comigo ela agia como uma louca. Mas uma louca, que eu sentia uma total e completa onda de amizade. Claro, aquilo deveria dizer alguma coisa dá já minha deteriorada sanidade.

A tarde caia depressa, e o céu rapidamente adquiriu aquele tom avermelhado do poente. Era bonito, e eu sentia a brisa suave e doce, da rua arborizada da casa de Patrícia, assim como o seu belo jardim florido.

Os pais dela estavam viajando, então ela estava sob a tutela de sua avó, que rapidamente se juntou a nós, trazendo chá gelado e biscoitos - aquela coisa fofa que todos esperamos das avós. A única coisa que eu não esperava era que a avó de Patrícia fosse jovem e tivesse a mesma pele bonita da sua neta, a mesma cor de um chocolate brilhante e fosse tão divertida. Seu sotaque era carregado, e ela nos divertia contando histórias da década de sessenta, dos “rapazes” da sua época, e agindo como uma de nós. Eu não conhecia muitas pessoas como Jaminie, ou “vovó Jaminie”, como ela gostava de ser chamada.

Eu percebi que estávamos tão ligadas as histórias da avó de Patrícia e ao vizinho novo, e aproveitei para chegar mais próximo de Danielle, que mantinha aquele ar distante que eu já tinha visto tantas vezes aquela semana. Irritada ou não, eu precisava falar com ela.

- Dann – eu chamei baixinho, com medo de chamar a atenção das outras.

- Eu sei, eu sei. Precisamos conversar. Mais tarde, huh? Não é apenas você que tem toneladas de perguntas, eu também tenho várias a seu respeito.

- Perguntas a meu respeito? – eu me assustei. O que ela queria saber sobre mim? Eu já estava tão estranha que até Danielle, que para mim, apesar de sua aparência de boneca, parecia uma alienígena a maioria das vezes. Uma que eu gostava muito, diga-se de passagem, mas mesmo assim, estranha.

Ela olhou ao redor, para ter certeza que ninguém estava prestando atenção em nós. E aparentemente não estavam, pois a vovó Jaminie havia conseguido atrair o vizinho bonitão com um copo de chá gelado. E com três garotas que eram todas sorrisos para com ele, claro.

- Sim, a seu respeito – ela confirmou – ou você acha que eu não reparei como você ficou estranha quando encontramos ás duas garotas , bruxas como eu, ontem a tarde. Você ficou tão estranha como eu. E além do mais, sua aura é tão confusa, que eu me perco e...

Eu a cortei sutilmente, tocando em seu braço. Não era sobre minha aura, fosse ela confusa ou não, ou outras coisas do tipo que eu queria conversar.

Não naquele momento.

- Não é isso que eu quero conversar Dann. É sobre outra coisa.

- Ah é?

- É sobre o Jack... - eu disse com um suspiro.

- Oh – ela respondeu. Eu adiava quando ela fazia isso.

- O que você quer dizer com “Oh”?

- O que você quer falar sobre ele?

- Você...você acha que ele realmente pode estar tendo algum tipo de interesse por mim?

Ela deu aquela risada suave, toda a tensão em seu rosto rapidamente esquecida.

- Oh, é isso? Acho sim, e isso é ótimo!

- Eu não – eu disse simplesmente.

- Por quê?

Nem eu sabia ao certo, mas conforme eu ia pensando, a idéia ia ficando mais e mais forte em minha mente.

- Porque eu sou nova aqui – respondi – e eu não estou pensando nisso no momento. E eu estou adorando a turma, não quero que nada atrapalhe, pois eu não vou corresponder a isso, entende?

- Não – ela disse – você tem uma razão mais forte do que a que esta me dizendo. Não vou perguntar agora. Mas o Jack é uma graça. Pense nisso, se há um garoto legal, esse é o Jack.

Eu não duvidava disso. Nem por um momento. Mas não era isso. Como eu poderia explicar a ela coisas que eu ainda não entendia. Como o fato de que, eu já estava pensando em outra pessoa. Alguém que eu sabia que não deveria , mas eu pensava. Oh, eu tinha que reconhecer, eu pensava. Ele não havia saído da minha mente desde o encontro que tivemos pela manhã.

- Uma graça – ela repetiu. Em seguida ela piscou, apontando para um carro já bem conhecido que parava em frente a casa de Patrícia –Olha, eles chegaram.E Nicolle , você se preocupa demais. Desse jeito vai ter rugas antes dos trinta anos. Aproveite um pouco a vida.

Jack, Michel e Paul desceram as pressas do carro de Jack, com varias e varias caixas de pizza nos braços. Jack e Michel estavam usando apenas uma regata, as suas peles bem bronzeadas, mostrando o quanto eles haviam aproveitado o dia de sol. Paul, ao que indicava a sempre branca pele, havia ficado bem escondido em sua camiseta pólo.

Eles nos cumprimentaram, todos animados, rindo e contando como havia sido a regata,da velocidade dos barcos, assunto que aparentemente deixavam eles todos excitados. Michel beijou Patrícia de um jeito doce e cúmplice e, e eu me senti até mal por estar olhando. Eles completavam um ao outro.

Percebi também, pela primeira vez como Julliet e Paul ficavam constrangidos perto um do outro. Estava claro que eles tinham um interesse mútuo, apenas eram tímidos demais para confessar. Oh, eu queria ajudá-los de alguma forma. Eu iria pensar nisso.

Foi então que Jack se aproximou de mim, com as bochechas um pouco vermelhas, e os olhos brilhantes e vivos. Foi então, que por algum motivo, eu o olhei de verdade pela primeira vez. Foi como um choque. Sim, ele era uma graça.

Através de sua regata verde e justa, percebi que ele tinha os braços bem torneados e musculosos, a pele dourada pelo sol. Os cabelos louros e espetadinhos brilhavam.

Mas o que mais surpreendia sobre ele, era o sorriso, quente, os dentes brancos e bonitos. Duas covinhas apareciam em suas bochechas, deixando o seu rosto como o de um garotinho na manhã de Natal.

Ao ver que eu o estudava, o sorriso dele aqueceu ainda mais e se largou.

- Oi Nicolle – ele disse todo animado – ainda bem que você veio.

Por algum motivo eu fiquei feliz com a forma que ele falava comigo, como se eu houvesse melhorado de alguma forma o seu dia.

- Oi – eu disse – claro que eu vim, eu não iria perder meu primeiro sábado com vocês.

Eu ouvi os risinhos das garotas, e percebi que todos nos observavam, Até a vovó Jaminie. Fiquei sem graça e me afastei alguns centímetros de Jack. Eu não havia percebido o quanto estávamos próximos.

Fiquei mais sem graça ao perceber que alguns minutos atrás, minha mente estava perdida pensando em outro garoto e agora eu estava aqui, percebendo pela primeira vez como Jack era bonito.

- As pizzas vão esfriar – vovó Jaminie cortou, dando um tapinha amigável no braço de Jack – vamos entrar garotos.

Eu rapidamente virei em direção a casa de Patrícia, quando uma voz doce e um pouco rouca falou bem atrás de mim.

- Temos a noite toda ainda pela frente. - eu ouvi Jack murmurar.

O final da tarde passou muito depressa, e quando eu percebi o bonito laranja do por do sol rapidamente se transformou no negro véu da noite.

As várias e várias caixas de pizza foram devoradas em pouco tempo, e quando eu der por mim estava rindo das piadas de Michel e Jack, implicando com o pobre Paul, que ficava na maioria das vezes vermelho como seus cabelos.

Era muito divertido, e percebi que todos eles, realmente formavam uma família. Muitas vezes brigavam entre si, como Hellen e Julliet que constantemente discutiam por alguma coisa boba, como qual ator de cinema era mais gato, ou a grife mais badalada de roupas no momento.

Danielle estava em uma animada conversa com vovó Jaminie sobre ervas e plantas.Ela anotava cada explicação recebida em um caderninho de couro preto.

Quanto ao Jack, ele foi o perfeito cavaleiro a noite toda, realmente me cercando de todo tipo de atenção que uma garota poderia desejar. Claro que me incomodavam os olhares fortuitos de todos os nossos amigos, e aquele clima de conspiração que eu sentia ao meu redor, como se todos realmente estivessem esperando que algo acontecesse entre nós. Era assim quando ele me servia mais um pedaço de pizza, ou perguntava se eu queria mais um copo de refrigerante. Ou mesmo quando no meio de alguma historia ou piada, ele sorria para mim, ou sempre tentava alguma forma de me tocar, em meu braço ou alguma mecha de meus cabelos.

Eu percebia que eu não estava incomodada com toda aquela atenção, era doce e gentil, e toda garota gostava de ser um pouco mimada, ainda mais por um cara tão fofo como o Jack. Mas eu não sentia aquele frio na boca do estômago quando estava perto dele, nem aquele nervosismo de fazer ou disser algo errado. Era simples e amigável.

Mas no fundo, eu sentia uma pontinha de tristeza, pois era justamente isso, amigável.Pois minha mente pensava em outra pessoa, de uma forma que eu ainda não conseguia reconhecer.

Eu estava detestando isso. Eu detestava não ter o controle sobre mim, o que já começando a se tornar um fato. Durante toda aquela longa semana eu quase não havia tido controle sobre mim mesma.

Jack estava sentado ao meu lado no sofá, com várias caixinhas de filmes no colo, pedindo a minha ajuda para escolhermos qual assistiríamos naquela noite. Aparentemente a testosterona dos garotos ainda estava a mil, pois ele queria que escolhêssemos entre “300” e o “Clube da luta.”

Foi então que eu percebi que o tema da conversa estava mudando novamente. Eles estavam discutindo sobre a regata Thonsom, a regata que levava o nome da empresa do pai de Trevor, o melhor amigo de Henry Nicholls.

- Exatamente quem do colégio estava lá, Michel? – perguntou afoita Hellen.

- Praticamente todos os filhos dos poderosos – disse Michel, visivelmente mais preocupado em beijar Patrícia do que com as fofocas que Hellen tinha tanta curiosidade em saber.

- Não – ela cortou impaciente – não, apenas isso não basta. Eu quero nomes. Os caras do Lions estavam lá?

- Todos.

- Jéssica e as outras metidas?

- Todas também. Completamente nojentas e se sentindo as superiores do mundo.

- Henry Nicholls estava com ela?

Com essa pergunta ela tinha minha total e completa atenção. Meu coração deu saltos dentro de meu peito, e eu esperava que, o fato de eu ter derrubado varias caixinhas de filmes no chão fosse considerado apenas um ato desastrado, não um ataque de pânico ao ouvir o nome de Henry Nicholls.

- Como assim Patrícia? – Michel estava meio impaciente, tentando aproveitar um momento de distração de vovó Jaminie com Danielle.

Já Dann, eu percebi pelo canto dos olhos, estava prestando atenção na conversa, tanto como eu.

- Como assim, oras, assim mesmo Michel, eles estava juntos se agarrando, ela se sentindo a dona do mundo , estas coisas?

Paul que, na maioria das vezes sempre ficava quieto, entrou na conversa fofoqueira de Hellen.

- Eles estavam juntos sim – ele afirmou – mas não vi nada de mais não.

- Oh, como não? - A vozinha de Hellen cada vez mais alta – como, nenhum escândalo?

- Nenhum. Você sabe que o Nicholls é discreto. Quem estava bem alterado era o Trevor e aquele amigo dele, aquele cara que acabou de chegar de Miami... Qual o nome dele?

- Sam – completou Jack meio de mau humor. Percebi que ele não gostava de nenhum assunto que se referia ao Henry.

Eu ao contrario ouvia tudo com muita atenção. E queria perguntar detalhes dele com Jéssica, mas eu não poderia ser tão patética na frente de meus novos amigos.

- Isso mesmo, Sam – Paul afirmou, no maior discurso que eu já havia visto ele fazer naquela longa semana – Aquele cara é enorme. Ele e Trevor estavam com várias garotas. E meio bêbados.

Com isso eles tinham a atenção novamente de Michel.

- Oh cara! Isso é ridículo – ele se lamentava – a uma semana do jogo contra Laguna e estes caras estão curtindo uma bebedeira em vez de treinar? Completamente ridículo. Nós que deveríamos estar no time, hein Jack?

- Nós não somos ninguém importante Mich. O treinador não nos daria nenhuma chance, e você sabe disso.

Eu percebi uma ponta de raiva na voz de Jack?

- Oh cara, sem essa. Você é campeão de luta romana do colégio, claro que se você quisesse um lugar no time eles te dariam.

- Não. Você sabe que com os Lions não funciona assim. Você quer mais um copo de soda Nicolle?

Eu percebi que ele estava frustrado com aquela conversa, era fácil perceber, pois Jack era aquele tipo de cara bem fácil de ler. Eu apenas assenti com a cabeça, enquanto o via sair em direção a cozinha, visivelmente irritado.

Aquele assunto também estava me irritando. Eles estavam discutindo sobre o tal de Sam, um cara moreno e enorme, que havia se mudado de Miami naquele ano, pelo que eu havia escutado pelos corredores do colégio. Corredores estes, aonde sempre estavam circulando alguma fofoca, ou escândalo, bem ao gosto da sociedade dos ricos herdeiros de West Palm.

Eu estava cansada. Cansada e frustrada, pois eu ainda queria saber sobre a metida da Jessica com Henry Nicholls, queria saber se eles estavam se agarrando ali , na frente de todas aquelas pessoas, Jéssica com aquele olhar triunfante e desafiador que ela sempre tinha no rosto, como se realmente ela fosse a princesa a ser homenageada.E depois de nosso encontro pela manhã, doía saber que pouco tempo depois ele estava ali, com aquela metida da namorada dele.

Eu precisava de ar. Oh, eu na realidade precisava dormir. Uma longa noite de sono, daquelas de no mínimo doze horas, sem sonhar com nada, apenas o torpor completo.

Eu sai de fininho, aproveitando que todos estavam discutindo sobre o time de futebol, o jogo de sexta feira que vem e sobre as injustiças do colégio.

Eu fui em direção da varanda da casa de Patrícia, que ficava nos fundos, bem de frente com a piscina e com a enorme variedade de plantas de sua avó.

Fiquei ali por um longo tempo, pensando em todas aquelas pessoas e situações que eu estava vivendo. Naquele mundo diferente do mundo, simples que eu vivia. Não que não houvessem idiotas no meu antigo colégio, claro que eles existiam, mas as suas idiotices não eram contadas ou apaziguadas pela enorme quantia de dinheiro que as contas bancárias de suas famílias tinham.

Eu, por muitas vezes, queria voltar no tempo, para um tempo simples, que eu não pensava em um garoto que parecia impossível para mim. E para um tempo que eu tinha a minha sanidade e todas as minhas noites muito bem dormidas.

Quando eu já estava percebendo o quanto eu estava sendo ridícula, e estava ficando com muita raiva de mim mesma por estar me lamentando tanto, eu senti uma mão forte tocando o meu ombro com delicadeza.

Quando eu virei para traz, Jack estava ali, um copo de soda na mão e um sorriso torto nos lábios

- Assustei você? – ele disse o sorriso enorme iluminando todo o seu rosto

- Não. – eu tentei sorrir de volta, o que não era difícil, pois era bom estar ao lado dele, pelo menos enquanto ele não tentava flertar comigo.

- O que você esta fazendo aqui ? Enjoou da falação toda na sala?

- Não – eu menti – apenas estou um pouco cansada e precisava tomar um pouco de ar.

- Ah – ele disse . Após alguns segundos de silencio, ele continuou, com a voz baixa – Você quer ficar sozinha, ou posso te fazer um pouco de companhia?

Eu ri com o tom sentido da voz dele.

- Hum, eu acho que posso suportar um pouco de companhia – eu disse entre risos.

Ele se aproximou de mim e ficou encostado na mureta da varanda, assim como eu estava. Após alguns segundos de silencio, eu olhei de soslaio para ele, e percebi ainda um pouco de irritação em seu rosto, o que não combinava com ele, sempre tão alegre e gentil.

Eu me aproximei um pouco dele e dei uma leve cotovelada nele, de brincadeira.

- Hey - eu disse – tão irritado? Isso não combina com você.

Ele olhou para mim, um pouco alarmado.

- Oh, me desculpe – ele gaguejou – sinto muito.

- Por que você esta pedindo desculpas? – eu estranhei.

Ele ficou ainda mais constrangido, uma leve cor avermelhada colorindo o rosto dele.

- Porquê você tem razão , eu não gosto de ficar assim. Nunca vale a pena, não é?Ainda mais hoje.

Eu gostava do tom leve que estávamos conversando, então rapidamente mudei de assunto.

- Quer dizer então que você é campeão de luta , huh ? Achava que era apenas para deixar você em forma para os palcos.

Deu certo, ele riu.

- Nah. Eu gosto de esportes. Apenas a minha paixão verdadeira é o teatro. Eu gosto de atuar, eu gosto de poder ser qualquer pessoa quando encarno um personagem. Eu gosto de estar livre de qualquer amarra. Não é isso que você também gosta Nicolle, pois você também fazia teatro em Seattle, não é? Você gosta de ser outra pessoa? Não precisar mostrar quem realmente você é?

Eu nunca havia pensando dessa forma. Eu nunca quis me esconder, eu nunca quis ser outra pessoa. Eu sempre gostei de ser quem eu era e como eu era , e até estes dias atrás, eu sempre me senti forte e decidida, em qualquer situação.

- Eu apenas gosto de todas aquelas histórias Jack. Eu nunca pensei em precisar me esconder...

Ele ficou ali, olhando para mim, ficando cada vez mais perto. Ele abaixou seu rosto para me olhar bem de frente. Foi então que eu percebi que algo estava se passando na cabeça dele.

- Você não precisa – ele disse com a voz rouca – você realmente não precisa se esconder. Você é linda demais para se esconder.

Eu precisava mudar de assunto. Eu não estava gostando aonde aquela situação estava nos levando.Rápido demais, aquilo estava indo rápido demais.

- Por que você estava tão irritado Jack? – eu perguntei tentando ficar alguns centímetros longe dele.

Ele suspirou, mas não se afastou de mim.

- Porquê é injusto Nicolle – ele disse - porque é injusto você ser julgado pelo que você tem, ou por ser filho de alguém poderoso, e não por ser quem você é, não pelo talento que você tem..É por isso que eu luto, por isso que eu quero ser alguém, por isso que eu quero vencer um dia.

Tristeza cruzou os olhos dele e meu coração doeu. Ele parecia tão desamparado que eu levei minha mão em direção ao seu braço e a deixei ali.

O que eu percebi que foi um erro, pois ele novamente ficou ali me olhando, os olhos brilhando intensamente, e ele aproximou novamente o seu rosto do meu.

- Mas as vezes – ele disse com uma voz tão doce que chegou dentro do meu coração – as vezes conhecemos alguém que vale realmente a pena.

Ele levou a mão em direção ao meu rosto e tocou gentilmente a minha bochecha. Seu toque não era elétrico como havia sido o de Henry Nicholls. Mas era quente e suave e eu gostava, apesar de não mandar aquela onda de euforia e energia que eu havia sentido antes.

Foi então, vendo que Jack estava ali, tão gentil e tão próximo a mim, e ao que parecia, que estava a ponto de me beijar, que meu coração doeu. Pois eu percebi que talvez houvesse ficado menos reticente com aquele contato se houvesse sido outra pessoa.

E dos meus encontros anteriores, que se resumiam á minha festa de quinze anos e um Bradley Mirror cheio de espinhas e o baile do primeiro ano que eu havia ido com Dean Jonas, que ficou bêbado e tentou passar a mão em mim, aquela deveria ser a cena mais doce de toda a minha vida. E com um cara que realmente valeria a pena.

Mas eu não queria que Jack me beijasse. Talvez alguma parte de mim queria, pois ele era tão gentil, e fofo e bonito, e eu adorava estar na companhia dele. Mas a minha maior parte estava tão confusa, e aquilo estava indo tão rápido que se eu deixasse ele me beijar, eu provavelmente ficaria mais confusa ainda.

Eu toquei a mão de Jack, que segurava o meu rosto, e a afastei gentilmente.

- Não Jack – eu murmurei – por favor, não.

- Por quê? – ele murmurou seu rosto ainda mais próximo ao meu, tanto que eu podia sentir sua respiração em minha pele.

O que eu iria dizer. Como eu poderia escapar daquela situação sem magoar o seu coração? Como?

Eu dei a primeira desculpa que veio a minha cabeça.

- Porque eu deixei alguém para trás em Seattle, Jack. Eu deixei um namorado para trás.

- Oh – ele disse , se afastando completamente de mim agora. – Oh, me desculpe, eu não sabia. Você não falou sobre um namorado com ninguém.

- É que foi muito rápido Jack, a minha mudança, as coisas que eu tive que me adaptar, e eu nunca fui muitos de falar. Mas eu gosto muito de você Jack, apenas eu não posso, por esse motivo eu não posso.

Ele parecia confuso por um momento. Confuso e constrangido. Mas eu sabia que o que eu havia feito havia sido o melhor. Para nós dois.

Então de repente o sorriso dele voltou, e ele se inclinou tão rápido que eu não tive tempo de me afastar. Ele deu um beijo suave em minha bochecha.

- Eu não me arrependo de ter tentado. Eu gosto de você Nicolle, e aceito ser só seu amigo, se você também quiser. Mas se você quiser algo mais, eu também não vou desistir ok?

- Jack – eu tentei argumentar – Isso não deixa nada estranho entre nós, não é? Eu também gosto de você e quero sim ser sua amiga, mas algo mais...

- Nada estranho - ele cortou – amigos. Mas um cara tem o direito de tentar. Certo?

Então ele riu aquele sorriso gentil que eu estava aprendendo a gostar tanto,
e eu percebi que sempre gostaria dele como amigo. Mas eu não podia incentivar algo mais. Eu precisava colocar minha cabeça no lugar.

- Vamos voltar para dentro – eu sugeri, tentando ser condescendente – senão daqui a pouco todos estarão falando de nós.

Ele riu aquela risada sonora de antes.

- Eles já estão, acredite eles estão. Todos gostamos de uma boa fofoca.

Quando voltamos para a sala, realmente todo estavam nos olhando, com aquele ar suspeito e ansioso, de saber se havia acontecido algo entre nós. Eu tentei ficar meio distante de Jack para não incentivar nenhum comentário. Mas eu o tratava como antes, como um amigo e ele em nenhum momento demonstrou que houvesse ficado chateado com a minha rejeição. Pelo contrario, continuou gentil e doce.

Mais tarde, quando eu estava no carro de Danielle , indo para sua casa, eu percebi que ela me olhava com expectativa. Eu olhei para ela e sorri, pois não estava nem irritada pela velocidade de tartaruga dela. Eu precisava realmente ir um pouco devagar aquela noite.

- Quer conversar? – ela sugeriu, com cautela – você esta muito quieta.

Eu suspirei. Sim, eu queria ao menos um pouco.

- O Jack. Ele tentou me beijar.

- E o que você fez?

- Disse que eu tinha namorado. Em Seattle.

- O que é mentira. – ela afirmou.

Eu assenti.

- Por que você esta pensando em outro garoto. E você não quer falar sobre isso.

Eu assenti novamente. Ela estava certa. Como sempre.

- Você não precisa – ela disse – não precisa conversar sobre isso se não quiser já que temos muita coisa mesmo para falar. Mas Nicolle, sempre de ouvidos ao seu coração. E nunca desista, por achar que o que você quer é tolo.

- E se eu não souber o que eu quero? – eu perguntei.

- Dê ouvidos ao seu coração. Ele é seu maior oráculo.

- Isso é uma lição de bruxaria? – eu perguntei.

- Isso é uma lição de vida, mas eu aprendi isso com uma bruxa. Quer dizer, em um livro, pois eu ainda não havia conhecido outra bruxa de carne e osso, mas já é alguma coisa, não é?

- E o que mais a bruxaria ensina? Como acalmar um coração e uma mente confusa?

- Talvez. Apesar de eu nem ser a pessoa mais normal do mundo, não é? – ela deu um sorrisinho tímido ao falar isso.

Então eu tomei uma decisão. Eu estava tão confusa que eu precisava tentar
encontrar meu ponto de equilíbrio. Eu sempre havia sido uma pessoa agnóstica, alguém que acreditava somente naquilo que estava vendo. Mas eu gostava de conhecimento. Eu sempre gostei do conhecimento e aquilo poderia de alguma forma jogar alguma luz em meus estranhos dias.

- Dann – eu pedi – eu quero aprender um pouco mais sobre bruxaria. Você me ensina? Mas nada que me faça rezar no meio do trânsito pedindo perdão por folhinhas mortas, por favor.

Ela riu, mas não parecia surpresa com o meu pedido.

- Eu posso. Mas antes vamos cuidar de sua insônia. Depois vamos introduzir você no Caminho da Deusa.

Eu sorri. Quem sabe aquela não era a chave para os meus mistérios.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Oi amigos

Os capitulos estão um pouco atrasados ... A net resolveu ter pane na minha região, e esta se normalizando ainda. E além do mais, uma crise absurda de gripe rondou a minha casa. Mas ... logo estará tudo normalmente sob controle.

Bom, novidades? Aderi ao twitter . Legalzinho! Quem quiser me seguir, por favor , vou ficar super contente : www.twitter.com/itagaby

No orkut : http://www.orkut.com.br/Main#Profile.aspx?uid=1431011057352122747&rl=t

E msn : itagaby@hotmail.com

Normalmente eu fico meio perdida e demoro para responder, mas fico super feliz com novos amigos.

Para quem é de Campinas também, dia 27/06 ( sabado ás 19hs , Livraria Cultura , Shopping Iguatemi ) vai ter um encontro literário do grupo Cria literária ( valeu Mariana ! ) e vou estar lá.É sempre bom conhecer pessoas novas, ainda mais que também tem o gosto da leitura dentro de si.

Um beijo enorme a todos e já estava com saudades

Gaby

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Cap. 9 postado !!!!!!

E para quem ainda não ouviu , segue o link das músicas que inspiraram os nove primeiros capitulos.

Bjokas Bjokas

Gaby


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Cap. 9 - O amanhecer

Ele caminhou decididamente em minha direção, cada passo calculado, apesar de eu ver que, em seus olhos, ele não parecia tão certo do que estava fazendo.

Talvez fosse a coisa certa a se fazer, já que éramos companheiros de turma, parceiros de trabalho, sei lá, estas coisas. Talvez ele fosse realmente tão educado que não apenas passaria por mim, já que estávamos sozinhos em uma praia àquela hora da manhã.

Talvez ele só tentasse entender quem era a louca garota que via o dia amanhecer – e sozinha – sentada na areia

Eu tentava dar mil explicações enquanto o via caminhando em minha direção, vendo seus lindos olhos azuis me olhando com espanto, o maxilar duro e aquela expressão sombria que eu já havia aprendido a ver em seu rosto.

Ele diminuiu o passo quando estava a poucos metros de mim. Eu ainda pretendia correr, e acho que dei uma tentativa frustrada de me levantar, inconsciente do que estava fazendo, fosse por qualquer motivo oculto que a minha confusa mente tentava me mostrar. Fosse qual fosse o motivo, eu estava ali, ao mesmo tempo curiosa e surpresa por ve-lo ali, na minha frente e ao mesmo tempo assustada justamente por isso.

Ele respirou profundamente e ficou ali me olhando. Eu olhei de volta, tentando mirar apenas em seus olhos, e tentando não ser uma panaca completa ao secar aquele peito maravilhosamente talhado. Não seja ridícula. Tudo bem que o cara é quente, mas qual é?
E
le caminhou os poucos passos que nos separavam e parou bem ali, na minha frente, a roupa de borracha e seu corpo molhados, os cabelos desalinhados, tão lindo que eu quase perdi o resto de dignidade que ainda tinha.
Quase.

- Oi Nicolle – ele me disse a voz rouca e melodiosa.

Por favor, não haja como uma idiota, fale com ele. Mesmo sentindo um arrepio correndo pela minha espinha ao o ouvir dizer o meu nome.

- Oi.

Ele ficou ali, alguns segundos apenas olhando para mim, visivelmente constrangido – ou me achando uma idiota – passando os dedos apressadamente pelos cabelos negros.

- O que você faz aqui, a esta hora ? – ele finalmente disse.

O que eu ia responder? Eu sou uma louca provavelmente a beira de algum surto psicótico?

- Acabei perdendo o sono – eu respondi simplesmente – e esta praia é perto da minha casa. Achei que era uma boa hora para uma caminhada.

-Oh, entendo.

O que ele queria dizer com “Oh, entendo”?

- E você? – eu completei, tentando não deixar o nervosismo transparecer em minha voz – você provavelmente chegou mais cedo ainda do que eu. Também caiu da cama?

- Eu gosto da praia a esta hora da manhã – ele respondeu meio que chutando as palavras – é mais tranqüila, boa hora para surfar.

- O surfista solitário... – eu deixei escapar, quase tendo um troço ao perceber que eu tinha falado as palavras em voz alta.

Ele sorriu ainda completamente parado na minha frente.

- Posso me sentar? – ele perguntou.

- Claro – eu respondi, controlando a minha voz, tentando deixá-la calma, apesar de meu coração bater forte como tambores daquelas tribos africanas que vemos no National Geographic.

Ele colocou a prancha de lado, e lentamente se sentou, a poucos centímetros de mim. Eu podia sentir a sua presença como uma onda magnética, deixando todos os meus sentidos despertos.

Qualquer motivo que havia me trazido àquela praia havia sido esquecido, minha mente ocupada com a forma que eu me sentia em sua presença e as complicações que isso me traria.

O sol ficava cada vez mais alto no céu, aquecendo rapidamente o meu corpo, levando a brisa gelada da manhã embora. Percebi que não estávamos mais completamente sozinhos, um fofo casal de velhinhos andava de mãos dadas pela orla.

Quando eu voltei os olhos para ele, percebi que ele me estudava. Seus olhos sérios e profundos, procurando alguma coisa nos meus.

- Adaptação difícil? – ele finalmente perguntou.

Aquela pergunta me pegou fora de aguarda. Por algum motivo eu senti um súbito desejo de ser sincera.

- Sim – eu respondi, tentando não deixar as preocupações aparecerem em minha resposta – aqui é muito diferente de onde eu vim. Talvez seja difícil para você entender....

Ele ficou ali me olhando muito seriamente, seus olhos daquele azul escuro e profundo.

- Por quê? – ele perguntou.

- Você faz parte desse mundo, Henry, talvez não o enxergue com os mesmos olhos que eu, talvez não veja a inveja e a competição e o mundo de aparências. – então eu me lembrei de nossa ultima conversa e fiquei com medo novamente de sua reação. – Não que eu esteja julgando você, foi apenas um comentário.

- Talvez eu enxergue com os mesmos olhos que você – ele continuou com um suspiro, a voz grave – Talvez eu também lute para não me tornar igual a eles.

Ele não terminou o seu pensamento, eu percebi isso rapidamente, como se ele houvesse soltado apenas um fragmento do que passava em sua mente. Eu rapidamente ardi de curiosidade, pois eu sempre o vi como parte daquele mundo milionário e esnobe.

Mas então, eu percebi que algo estava errado em meu pensamento. Eu disse sempre? Mas se passaram o quê, sete dias desde o primeiro dia que eu o vi?

Parecia uma eternidade sem fim para mim, e não apenas o espaço de uma semana.

Acho que eu devo ter ficado ali, olhando pateticamente para ele , quando ele finalmente quebrou o momento com um sorriso leve , mas lindo.

- O que nos leva de volta a você – ele continuou – e ao que faz sozinha em uma praia parcialmente deserta.

Eu não pude resistir e sorri ao seu comentário. Ou a presença dele, eu não sabia ao certo.

- Não tão deserta – eu apontei para o posto policial e a dois caras vestidos de uniforme, embora o uniforme fosse uma bermuda e uma leve camisa de algodão , mas estamos em uma praia, afinal – Olhe ali, policiais, o casal de velhinhos caminhando e você o surfista...

- Solitário? – ele riu, arqueando uma das sobrancelhas.

Eu fiquei constrangida imediatamente com meu comentário anterior. O sorriso em seus lábios aumentou.

- Eu apenas estava pensando, o que alguém fazia tão cedo ali, perdido contemplando o oceano. Por isso o pensamento do surfista solitário, não é nada demais.

Ele riu um som baixo e abafado e jogou levemente a cabeça para traz, enquanto passava as mãos pelo cabelo. Eu devo ter atropelado as palavras, tentando chutá-las rapidamente pelos meus lábios, como eu sempre faço quando estou nervosa.

E eu estava realmente agitada com a presença dele, com medo de falar algo errado. E ao fato de ele estar com a roupa de borracha abaixada até a cintura, mostrando aquele corpo musculoso, quente e com um leve bronzeado, natural não como o do resto dos moradores de West Palm que sempre pareciam saindo de uma torradeira elétrica. Olhe apenas nos olhos Nicolle, por favor, que ele não me pegue secando aquele peito nu, por favor.

Após algum tempo olhando para o céu, ele voltou os olhos para mim, me olhando tão intensamente que eu senti um frio na boca do estômago, como se aquele olhar tivesse o poder de entrar dentro de minha alma.

- Eu gosto da solidão – ele finalmente disse – eu gosto do mar e de imaginar lugares que eu poderia ir, caminhos que eu poderia trilhar. Eu gosto do silêncio do mar áquela hora.

Eu passei as mãos pela areia, sentindo sua macies e calor, enquanto eu pensava nas palavras dele. Seria ele solitário? Será que tudo que eu pensava sobre ele estava errado?

Foi então que ele tocou o meu braço, fazendo eu rapidamente olhar para ele. Novamente aquele toque, quente e elétrico, que fez meu corpo ter uma reação estranha, como eu houvesse colocado meu dedo em um interruptor. Eu me assustei ao seu toque e a reação do meu corpo e rapidamente olhei para a sua mão. Percebi que ele também ficou constrangido, pois retirou a mão rapidamente.

- Desculpe – ele murmurou.

Meu coração voltou a bater mais forte, e eu percebi que toda a angustia e solidão que eu sentia momentos antes haviam sido esquecidos.

- Foi para pensar – eu disse rapidamente, inconsciente de minhas palavras – eu vim para a praia, pois precisava pensar. E o primeiro lugar que veio a minha mente foi aqui, pois eu sabia que era um lugar tranqüilo e talvez o mar trouxesse as respostas que eu preciso.

Percebi que algo em minha revelação o deixou inquieto repentinamente.

Ele se levantou de um salto e ficou me encarando.

- Você quer caminhar um pouco? – ele perguntou.

- Eu não posso ficar muito – eu respondi – logo preciso voltar para casa.

- Apenas um pouco. - ele pediu – esta começando um lindo dia.

Ele estendeu a mão para me ajudar a me levantar. Eu ainda fiquei alguns segundos tentando me decidir se deveria ou não seguir o que ele pedia. Mas algo em seus olhos me fez segurar em sua mão, macia e quente. Percebi que ele tinha alguns calos, e eu imaginei que deveria ser pelos exercícios, pois até aonde eu sabia ele era um completo atleta. O seu toque me fez ficar agitada novamente, sua mão era grande, dedos longos e bonitos. E assim que eu estava de pé rapidamente a soltei.

- Como você descobriu esta praia? – ele perguntou.

- Guia turístico – eu respondi – apesar de não ter gostado nem um pouco de ter que mudar para cá foi a minha primeira providencia. Reconhecimento de área.

Ele sorriu para mim.

- Sempre tão prática?

- Sempre que eu posso – eu dei de ombros.

Caminhamos pela praia por algum tempo, eu tentando ignorar a água do mar que batia em nossos pés – e no meu caso em meus tênis que ficariam arrasados após esse passeio – o silencio constrangedor dando lugar a uma sensação de paz e tranqüilidade que eu não sabia se já havia sentido alguma vez em minha vida. Ele sempre me apontava alguma estrela do mar que era trazida pelas ondas ou alguma concha de forma diferente.

- Por que você e sua família se mudaram para cá? – finalmente ele perguntou.

- Meu pai teve uma boa proposta de emprego. Então todos nos mudamos.

- O que ele faz?

- É contador. Especialista em finanças e mercados e apesar de estarmos em DC foi aqui, na Florida que ele encontrou seu lugar.

- Finanças? – ele novamente arqueou a sobrancelha – Aonde ele trabalha?

Será que estávamos entrando na comum conversa de quem você é filho aqui? Ele sabia que eu não era ninguém, não precisava deste tipo e conversa. Eu fiquei um pouco decepcionada com a pergunta.

- Trench & Huggens – respondi a contragosto – parece que eles são grandes.

- Grandes não, os melhores. Seu pai deve ser realmente bom.

Um cara de dezessete, dezoito anos conhecendo um escritório de finanças?

- Você os conhece?

- Sim – ele deu de ombros – meu pai é cliente deles. Mas então ele deve ter pouco tempo para vocês, afinal é uma profissão bem intensa?

- Não, agora que ele esta aqui, ele tem mais tempo para a gente. Era ruim em Seattle, neste aspecto estou bem feliz com a mudança.

- Como assim? – ele parecia intrigado com algo que eu não entendia.

- Simples. Quando estávamos em Seattle ele trabalhava em um escritório pequeno, então sempre tinha que estar fazendo trabalhos em casa, ficar mais horas no escritório, tudo para ganhar mais. Agora ele tem mais tempo para nós, é muito melhor. Minha mãe esta feliz.

Vi que algo deixou seu olhar mais sombrio. Diminui o passo tentando ver em seus olhos o que era esta mudança

- Você tem irmãos Nicolle? – ele finalmente perguntou as sombras em seus olhos ainda não haviam desaparecido.

- Não. Somos uma família pequena. E você?

- Dois. Gêmeos. Joshua e Nathan.

- Nossa, gêmeos! Quantos anos eles tem?

- Dez.

Fiquei surpresa, pois ao falar dos irmãos percebi um leve brilho orgulhoso em seus olhos. Eu nunca havia visto isso em nenhum dos meus amigos, ainda mais se tratando de irmãos menores. Irmãos mais novos sempre eram uma fonte interminável de dores de cabeça. Pelo menos era isso que eu ouvia.

- Nossa. Eles devem deixar sua família louca – eu afirmei.

Ele riu aquela sombra em seus olhos dando lugar a um brilho que iluminava todo o seu rosto.

- Você nem imagina. Mas eles são muito inteligentes, cada um a seu modo. Eu estou ensinando Josh a surfar, então varias vezes eu o trago aqui. Ele é bom. Nathan faz o tipo intelectual precoce, então não consigo arrancá-lo muito de casa.

Eu estava começando a ficar preocupada com meu bom senso e aos sentimentos que despertavam dentro de mim na presença dele. Curiosidade, surpresa, e até um pouco de admiração. Ele era muito diferente do que eu supunha. Ali, longe de todos como estávamos, ele não lembrava o cara mandão e sombrio que eu estava acostumada nos últimos dias.

Foi então que eu estaquei no ato, olhando apressadamente para o céu, e olhando ao meu redor, para a praia que começava a se encher de vida e agitação.

- Eu tenho que ir – eu disse apressadamente.

- Tem certeza? – ele perguntou, muito serio novamente.

- Sim, eu tenho um monte de coisas para fazer. Eu te vejo segunda, na escola.

Eu já havia dado as costas para ele, quando eu ouvi a sua voz aparentemente ao meu lado.

- Eu lhe acompanho até o seu carro

Eu apenas assenti com a cabeça, tentando não sair correndo, tropeçando uma ou duas vezes sob meus pés, com certeza fazendo o papel de idiota.

Chegamos ao meu carro. Eu me virei em sua direção, para me despedir novamente. Foi então que nossos olhos se encontraram. Eu não conseguia fugir da força daquele olhar. Os segundos se passaram e ficamos ali, apenas nos olhando. Ele deu um passo em minha direção. Meu coração voltou a bater novamente naquele ritmo absurdo e descompassado. O que quer que estivesse acontecendo ali, não poderia ser bom. Eu forcei minha mente a se lembrar de Jéssica e dos amigos riquinhos e mimados dele, todos tão poderosos e tão reis do mundo. Qual seria o meu papel naquela história?

Eu não queria saber. Eu não pagaria para ver o final daquela cena.

Eu disse um tchau apressado e rapidamente entrei em meu carro.

- Espere – ele disse, inclinando-se levemente em direção a minha janela – eu tenho algo para você.

Eu o vi correndo para a esquerda, a prancha aparentemente esquecida ao lado do meu carro. Foi então que eu vi aquele carro branco, enorme, parado do outro lado da rua, não muito distante do meu. Como eu não o havia visto estacionado ali?

Em alguns segundos ele estava de volta, carregando algo pequeno em suas mãos. Foi então que eu percebi que era um livro. A capa antiga, de uma cor parda, com letras douradas, muito bonito.

Ele me entregou o livro. Era um exemplar de Adeus ás armas, o livro que teríamos que ler para a aula da Sra. Charlotte.

- O que é isso? – eu perguntei debilmente.

Ele se inclinou um pouco mais em direção a janela, seu rosto a poucos centímetros do meu.

- Uma antiga edição do livro do Hemingway, datada do começo da década de cinqüenta. Muito melhor do que a de hoje em dia. Eu há tenho há algum tempo, acho que vai ser boa para o nosso trabalho, já que você não o conhece.

Eu acariciei o couro macio do livro, muito bem conservado, apesar de ver que as paginas já haviam sido muito lidas. Era uma edição muito antiga, eu não poderia ficar com aquilo. E por que motivo ele estava dando isso para mim? Eu estendi a minha mão em sua direção, tentando lhe devolver o livro.

E tentando não pensar o quanto o rosto dele estava próximo ao meu.

- Eu não posso aceitar. É seu e muito antigo. Desculpe-me.

Ele se afastou alguns centímetros de mim.

-E um empréstimo então. Considere assim. Nos vemos depois, Nicolle.

Então ele virou de costas, pegou sua prancha esquecida do chão e se afastou de mim. Não olhou nem uma vez para traz. Entrou e deu a partida em seu carro, em poucos segundos sumindo da minha vista.

Sem reação, atordoada com o nosso encontro e com o inesperado presente – ou empréstimo – que eu tinha em minhas mãos, decidi que era hora de voltar para casa. Minha mente entorpecida, mas inesperadamente calma.

Todos os problemas que eu havia tido pela manhã esquecidos.

Encontrei meu pai sentado na porta de nossa casa, seu notebook no colo, com uma enorme xícara de café ao seu lado. Apesar e algumas rugas de preocupação vincando a sua testa, vi que ele estava relaxado, como eu não o via há anos. Ele digitava furiosamente, o olhar perdido em alguma coisa.

Rapidamente eu percebi que ele estava envolvido em seu projeto secreto, o seu livro. Um contador que gostava de histórias medievais. Este era meu pai.

Segurei fortemente o livro em minhas mãos e corri em sua direção. Com o espírito um pouco mais leve, era hora de amenizar de vez toda angustia que eu tinha feito meus pais sentirem nos últimos dias.

Sentei ao seu lado, e dei um rápido beijo em sua bochecha. Ele sorriu, um sorriso torto e protetor que eu amava.

- Tinham pulgas em sua cama? – ele perguntou – O que você fazia fora de casa tão cedo assim?

Eu dei de ombros.

- Fui correr um pouco na praia. Não estamos na Florida, aonde são todos bonitos, e bronzeados? Preciso me adaptar.

- Não caio nessa, mocinha. – e ele olhou em minha mão e me olhou significativamente – E o que é isso?

- Ah, isso. Um livro para a escola. Nada de mais.

- Você não esta escondendo nada de mim, não é?

Eu via a preocupação e carinho em seus olhos. Eu era grata pelos meus pais, e percebi que deveria ser melhor de agora em diante. Estávamos em uma nova vida, e eu deveria fazer parte dela.

- O que eu esconderia de você pai? - eu disse, sorrindo para ele.

- Você parece animada – ele observou aquele olhar interrogador nunca saindo de seu rosto.

- A Flórida não é tão ruim – eu dei de ombros novamente, não acreditando que aquelas palavras estavam saindo de minhas boca – Fiz novos amigos.

Ele bagunçou meu cabelo, visivelmente aliviado.

- Fico feliz que esteja começando a se adaptar. Era só uma questão de tempo, eu avisei a sua mãe. Agora entre, sua mãe fez panquecas.

Eu o beijei novamente no rosto e corri porta dentro para casa. Minha mãe era uma cozinheira imprevisível, mas uma coisa que ela sabia fazer como ninguém eram as suas panquecas.

Comi rapidamente e subi para meu quarto com a desculpa que tinha coisas a arrumar. E eu tinha realmente. Arrumei minhas roupas e livros espalhados, meus sapatos esquecidos em pilhas pelos cantos. Percebi que eu havia tido uma semana completamente maluca e meu quarto espelhava meu estado de espírito. Liguei o som alto, e deixei a música embalar minha mente e meus pensamentos, tentando não pensar no encontro com Henry naquela manhã e meus pesadelos esquecidos.

Respondi alguns e-mails de meus amigos de Seattle, inclusive um de Becca, perguntando sobre os alunos gatos de meu novo colégio. Não entrei muito em detalhes, apenas garanti a ela que estava morrendo de saudades. O que era realmente verdade, eu tinha saudades de minha vida simples, sem confusões, de meus antigos amigos. Mas eu sabia que era hora de deixar minha antiga vida para traz e começar uma nova. Eu sabia que precisava crescer, mesmo sendo tão difícil.

No fundo eu sabia que havia algo grande vindo em minha direção. Essa sensação de não saber o que me esperava na próxima esquina que eu cruzasse que me deixava apavorada. Eu gostava das coisas bem simples, bem planejadas e traçadas. Eu não era a melhor pessoa do mundo para ganhar uma surpresa. Não importando como ela fosse.

Mas quando a porta da angustia estava começando novamente a se abrir, meu celular, meu sempre esquecido celular, vibrou, do outro lado do meu quarto.

Corri para pega-lo, e não fiquei surpresa ao ver que era uma mensagem de Dann.

“Chego na sua casa ás 3. Fiz varias descobertas mundo dos sonhos. Dann”

Com essa eu tive que sorrir. Dann estava sendo uma boa amiga. Uma ótima amiga para dizer a verdade. E eu sabia que estava começando a confiar totalmente nela, mesmo com todas aquelas esquisitices. Ela parecia pequena e frágil perante o mundo, mas me parecia uma pessoa forte, tão forte. Força que eu sempre tive e apesar de estar confusa e perdida, eu teria novamente.

As três horas pontualmente ela chegou. Dirigia – claro – o carro elétrico da sua mãe. Não era de se espantar que a garota natureza não poluísse o mundo.

Logo que eu abri a porta, vi que ela estava preparada. Trazia vários livros em suas mãos e uma mochila enorme em suas costas. Vestia uma túnica hippie de algodão e jeans, os cabelos bagunçados caindo em cachos pelos ombros. Ao me ver ela arregalou os olhos.

- Uau – ela disse.

Eu fiz uma varrição rápida em mim mesma, para ver se tinha colocado alguma peça roxa com vermelha, ou usado dois sapatos diferentes ou algo do tipo. Ou se simplesmente estava sem meus jeans, andando por aí apenas e calcinha. Pois o olhar dela foi justamente do tipo “Uau, olha o que ela fez agora!”.

- O que foi? – eu perguntei alarmada.

- Ela entrou pela porta da minha casa e novamente ficou ali apenas me olhando. Depois de algum tempo ela riu, e me puxou pelo braço, murmurando baixinho apenas para eu ouvir.

- Finalmente um pouco de luz em você Nicolle. Não sei ainda o que você fez, mas esta brilhando, uma luz ainda pálida, mas você esta brilhando, como que iluminada pelo sol.

Agora eu sabia que ela era louca, realmente louca.

- O quê? – eu perguntei com a voz esganiçada, histérica.

Ela deu de ombros.

- Você sempre esta encoberta por uma sombra. Hoje você esta brilhando. Posso saber o que aconteceu? Conseguiu dormir?

- Menos de três horas – eu suspirei – agora me fale o que é essa história de luz e sol...

- Depois – ela cortou - ali estão os seus pais.

Não preciso dizer que meus pais adoraram Dann, ainda mais que ela se comportou perfeitamente normal, sem nenhum discurso de luz do sol, ou ervas, ou nada do tipo. Apenas uma adolescente gentil e educada.

Meu pai ficou naturalmente encantado ao descobrir que Dann adorava antigas lendas medievais. Ficaram conversando por muito tempo sobre o Graal e muitas outras coisas que eu procurei limpar da minha mente. Eu tinha muitas coisas que queria perguntar a ela.

Mais de uma hora depois, consegui arrastá-la para meu quarto, com a desculpa que íamos fazer um trabalho para a escola.

Assim que subimos e ela entrou em meu quarto e eu estava preparada para um interrogatório ímpar, vi que ela começou a tirar um monte de coisas daquela sua mochila enorme.

Primeiro foi uma pequena vassoura, ou pelo menos parecia com uma – um galho de madeira e alguns galhinhos de ervas secas enrolados por um laço de palha. Ela pegou aquela coisa e começou a varrer o meu quarto, cantando uma cantiga estranha, que com certeza não era inglês.

- O que você esta fazendo Dann?

- Primeiro limpando o astral do seu quarto.

- O que? – eu gritei. Meu quarto estava perfeitamente limpo.

Ela ficou ali, literalmente alheia a minha presença, passando aquela pequena vassoura pelo chão, em cima da cama, por cima dos móveis. Depois ela pegou algumas varetinhas de incenso e começou a acender pelo meu quarto. Eu não fazia a menor idéia do que ela estava fazendo, mas o cheiro suave do incenso começou a espalhar pelo meu quarto, tranqüilizando os meus sentidos. Eu li o nome sândalo na caixinha.

Ela então pegou um vidrinho com água e começou a borrifar ao nosso redor. Apesar de não fazer a mínima idéia de todas as coisas que ela estava fazendo, eu estava sentindo uma estranha sensação de paz. Vi quando ela acendeu uma pequena vela branca em cima da minha cômoda e fiquei admirando a luz da vela dançando lentamente, em aspirais para o alto, como se quisessem alcançar o céu.

Eu tinha varias perguntas que queria fazer a ela, como o encontro com as bruxas no dia anterior e sobre a pesquisa que ela me disse que tinha feito. Mas a minha mente vagava para apenas um lugar. O encontro com Henry Nicolls pela manhã. Eu queria perguntar tantas coisas para ela, sobre quem era ele, queria mostrar o livro que ele havia me dado – ou emprestado – queria perguntar se ela sabia o que isso significava. Mas se eu dissesse alguma coisa, eu estaria confessando a mim mesma coisas que eu não sabia o que significavam. E eu não estava pronta para isso. Então fiquei ali, parada contemplando aquela chama azul e laranja da vela, dançando e dançando.

Uma mão em meu ombro chamou a minha atenção. Dann estava parada ali, os olhos fixos em mim.

- Hey – ela disse suavemente – você quer falar comigo não quer?

Eu continuei olhando para ela sem dizer nada.

- Sim, eu sei que você esta cheia de perguntas e coisas que você esta pensando se pode compartilhar comigo, mas não se preocupe, tudo a seu tempo. Você terá o seu próprio tempo.

A garotinha havia dado lugar a mulher sábia novamente. Como sempre ela fazia.

E eu queria falar e falar e falar. Eu precisava contar os meus medos, e anseios, todos os sonhos loucos e sem sentido da ultima semana. Mas eu continuei muda.

Quando um barulho finalmente me fez despertar do meu transe. Quando dei por mim Dann estava correndo para atender o seu celular que tocava incessantemente, perdido em sua bolsa.

Ela atendeu com uma risadinha.

- Oi Jack – ela piscou para mim – Sim, esta tudo bem... ok , a que horas? – ela fez uma longa pausa - ... não, eu estou com ela, não precisa se preocupar. Eu a levarei. – mais uma pausa – Nos vemos daqui a pouco.

- O que foi Dann? – eu perguntei.

- Era o Jack. Eles farão uma festa da pizza Na casa da Patrícia e estavam nos convidando – ela fez uma ênfase engraçada quando disse nos convidando.

Então ela se levantou e começou a arrumar as suas coisas. Então de repente ela virou para mim.

- Você pode dormir fora de casa esta noite ? Você pode dormir na minha casa?

A pergunta me pegou de surpresa. Novamente.

- Por quê? – eu perguntei.

- Por que temos muito o que conversar,minha amiga. E isso eu não precisaria ser uma bruxa para descobrir.

Ela tinha razão. Eu precisava conversar. Eu precisava confiar um pouco mais nas pessoas.

E por qual motivo em não confiaria em Danielle ?

domingo, 7 de junho de 2009

Amigos.

Amanhã o capitulo nove sai.

Um beijo enorme em cada coração e obrigada pelo apoio.

E por falar em beijo, o dia dos namorados esta chegando. Temos algum coração enamorado que acompanha o blog?

Gaby

quarta-feira, 3 de junho de 2009



Amigos

Gostaria de deixar minha solidariedade aos amigos e familiares dos passageiros do voô
447 da Air France.
Tantas vidas tragadas em um oceano de misterio. Histórias que se parecem com as nossas diárias - um casal em lua de mel, a viagem de trabalho, a comemoração de vinte e cinco anos de casamento, a viagem de uma vida, a realização de um sonho...
Tantas hgistórias que, a única coisa que posso desejar a todos é esperança e fé. E muita força para continuar a longa jornada da vida, pois com certeza era - ou ainda é - o desejo de todos os amigos, pais, mães , maridos, esposas e namorados ausentes.

Muita Força e Luz em cada coração.

Beijos

Gaby
Cap. 8 postado, playlist atualizada.

E por falar em playlist ,gostaria de dar uma dica sobre a banda Epica.Ela é perfeita para momentos , digamos ... "estranhos".

Não, brincadeiras a parte, eles são diferentes e tem um som bacana.

Um bjo nada estranho a todos e obrigada por todo o apoio !!!!!!!!!!!!!!

Gaby

terça-feira, 2 de junho de 2009

Cap. 8 - A solidão e o mar

Meu pai sempre me disse que para qualquer problema, o trabalho sempre é a solução. “Ocupe a sua mente que você encontrará a solução que precisa” ele dizia.

E foi justamente o que eu fiz.

Logo após a ceia, que era tradição na minha casa antes de irmos dormir, garanti a meus pais que precisava estudar um pouco.

Eles haviam ficado exultantes ao saberem que eu havia feito amizade com pessoas novas, ido ao shopping, aparecido com algumas sacolas de compras em casa.. Eu me certifiquei de deixá-los menos alarmados a meu respeito, recitando o nome de meus novos amigos e me surpreendi ao saber que a minha mãe conhecia os pais de Danielle e Jack.

Esta era a minha mãe. Conseguia conhecer uma infinidade de pessoas em um curto espaço de tempo. E isso não era apenas por causa de sua profissão, mas sim parte de como ela era. Ela devia ter sido algum tipo de líder estudantil quando era adolescente, pois ela sabia ser amigável e simpática.

Eu era mais parecida com meu pai. Um pouco introspectiva e demorava mais para confiar nas pessoas. Eu nunca fui a rainha da popularidade, mas sabia fazer amigos e me divertir em Seattle. Apenas eu precisava fazer as coisas ao meu tempo.

Então, eu lembrei o que realmente eu precisava fazer com o meu próprio tempo - exatamente agora. Com todo o meu descaso com as minhas aulas na primeira semana na West Palm Kings High eu sabia que precisava estudar.

E ocupando a minha mente, eu não precisava pensar nos meus pesadelos e no estranho encontro que tivemos a tarde com Aideen e Estella, as desconhecidas, que assim como Danielle, eram bruxas.

Não que eu realmente soubesse o que isso significava, mas o encontro- todo o encontro – era absurdamente estranho. Assim como toda a minha semana.

E,eu precisava admitir, eu não teria tempo para pensar em Henry Nicolls.

Sim, ele habitava minha mente desde o primeiro dia que nos encontramos, mas do que seria saudável.

Neste caso, pensamento nenhum é que seria saudável.

Então, eu afundei meus olhos nos meus livros e decidi que não pensaria em nada até amanhã. E eu esperava ficar cansada o suficiente para dormir.
Comecei pelo trabalho de Inglês que eu teria que entregar na segunda feira.

Uma redação de 200 palavras, espaço duplo, comparando a sociedade atual com a descrita por Jane Austen em “Orgulho e Preconceito”.

Bom,isso não foi exatamente difícil para mim e em pouco tempo eu já tinha terminado.

Passei para alguns problemas de calculo que eu detestava, mas teria que entregar na terça feira, após o almoço. Sempre foi minha pior matéria, e minha cabeça nas nuvens não ajudou muito esta semana. Tentei e tentei até minha cabeça doer e meus olhos quererem saltar das órbitas.

Eu estava exausta. Meu corpo todo doía, era como se meus músculos estivessem estirados e alquebrados.

Eu pensei em tentar mais alguma coisa. E me lembrei que teria que ler o livro do Hemingway, para as aulas da Sra. Charlotte.

Trabalho esse que eu era parceira de Henry Nicolls.

Pensar sobre ele, em Henry, fazia meu estômago se comprimir de uma forma que eu não gostava, ao mesmo tempo diferente, como eu nunca havia sentido, e ao mesmo tempo irritante.

Eu não queria mais sentir aquilo.

Eu segurava o exemplar de “Adeus as armas “, sua capa branca com as letras de um verde dourado e percebi que elas estavam começando a se misturar e embaralhar perante os meus olhos.

Atirei o livro para longe, desliguei a luminária de minha pequena escrivaninha e o computador.

O radio relógio que ficava no criado mudo ao lado de minha cama marcava duas e meia da manhã.

Ao me despedir de Dann, aquela tarde, ela havia pedido que eu colocasse um pouco de algodão embebecido em azeite doce embaixo de meu travesseiro para me garantir um sono tranqüilo.

Ela tirou uma pequena vela verde de dentro de sua bolsa –como que ela conseguia andar sempre com algo desse tipo sempre pronto dentro da bolsa, eu não sabia – que tinha um suave cheiro de alecrim.

Eu deveria colocar uma musica suave em meu player, acender a vela, e colocar o algodãozinho embaixo do travesseiro.

E, além disso, tentar relaxar.

Puxei bem as cortinas, acendi a vela e percebi que meu quarto todo se enchia da suave fragrância de alecrim. Era como se a névoa toda me envolvesse, e eu percebi em instantes que começava a ficar mais sonolenta e relaxada.

Apaguei a luz do quarto, o deixando iluminado apenas pela pequena chama. Afundei em meus travesseiros e me enrolei em meu edredom.

Apesar do calor que sempre fazia nos dias ensolarados da Flórida, a noite sempre trazia uma brisa gelada, vinda do oceano.

Eu fiquei fitando aquela chama delicada, que dançava e cintilava perante os meus olhos. A força do fogo envolvia os meus olhos e os meus sentidos.

Era mágico e magnético, e percebi que eu poderia apenas observá-la, por um tempo sem fim. Era como se todos os meus sentidos se acalmassem – e aos mesmo tempo ficassem mais despertos – apenas ao observar aquele a chama daquela vela.

Eu não percebi que meus olhos ficavam cada vez mais pesados e meu corpo mais leve. Minhas pernas estavam moles e minha respiração ficava cada vez mais profunda. Um doce entorpecimento envolvia o meu corpo.

E foi então que aconteceu.

Eu respirei profundamente algumas vezes e percebi que não sentia mais apenas o cheiro do alecrim.

Eu sentia um cheiro de madeira, forte e adocicado.

Eu abri bem os meus olhos. Não foi a chama da vela que brilhava perante os meus olhos. Foi a luz do sol, nascendo no horizonte, pintando de laranja e púrpura o céu, tentando romper o negro véu da noite.

Não eram os lindos e opulentes prédios de West Palm que eu via bloqueando a paisagem.

Era um mar verde sem fim, de arvores fechadas em suas altas copas, ainda escurecidas pela noite, dando um ar sombrio por onde eu olhava.

Eu não estava deitada quentinha em minha cama, mas sim sentada no gelado pórtico de uma janela, grande e de pedra.

Olhei para baixo e percebi que minhas pernas estavam suspensas. Um abismo sem fim jazia por sobre meus pés. Eu estava em um lugar alto, muito alto.

Com cuidado, recolhi as minhas pernas e entrei para dentro da câmara que eu estava. Era um quarto simples, com uma grande cama de madeira e algumas peles servindo de cobertor.

As paredes também eram de pedra, polidas como tijolos, e o chão de uma madeira rústica e limpa.

Uma lareira aquecida e iluminava o ambiente.

Eu via livros por toda a parte, organizados e livres de poeira. Um jarro e uma bacia de uma louça ricamente trabalhada estavam em cima de um enorme baú de madeira.

Eu me aproximei e deixei meus dedos tocaram a água gelada, brincando com as pequenas ondinhas que eles formavam. O silencio ao redor era total.

Foi então que eu percebi que a solidão me abraçava cruel e sufocante, oprimindo o meu peito, fazendo-o doer como nunca antes.

A realidade do momento me atingiu, dura e forte.

Eu estava sozinha, magoada e ferida. Traída. Eu havia sido traída pelo único homem ao qual eu havia entregado o meu coração.

Eu queria gritar e gritar, suplicando aos deuses que arrancassem aquela dor de meu peito.

Minha casa estava quieta.

O nosso protetor havia sido assassinado dias antes. Ele havia sido o meu pai, professor e amigo por tanto tempo, que eu já nem recordava mais o rosto de meu pai verdadeiro..

Eu tentava sentir meu poder queimando em minhas veias, mas eu o sentia fraco, tão fraco...Apenas um longínquo eco do que eu sabia que era capaz de sentir.

Eu voltei meus olhos para além das paredes de madeira daquele quarto e vi minha irmã, contrita em seu leito, subjugada pelo grave ferimento que sofreu na batalha que culminou com a morte de nosso protetor

Nossa sacerdotisa Mãe cuidava de seus ferimentos, seu lindo rosto vincado pela dor, circundada pelas minhas outras duas irmãs.

Estávamos sozinhas, completamente sozinhas.

E tudo isso por minha culpa.

Culpa pelo meu amor desenfreado. Ele havia nos traído. Ele havia me traído.

A dor estraçalhou o que sobrava de meu peito, e eu me deixei cair ao chão.

Eu sabia o que viria depois. Eu vi as luzes dos archotes ao longe.

Não teríamos tempo de fugir.

Eu apertei bem os meus olhos, tentando respirar, mas a dor bloqueava meus pulmões, fazendo com que eu contraísse os meus músculos, tentando desesperadamente encontrar uma fuga para meu clã.

Quebre um lado do círculo, e terá o quebrado por completo. Era o que dizia os nossos ensinamentos.Eu supliquei a Deusa para que nos ajudasse. Eu sentia toda a solidão do mundo me esmagar, como um homem esmaga uma formiga sobre a sola de seus sapatos.

Em minha súplica eu rezei, e rezei e rezei.

Eu sabia o que precisava fazer. Corri em direção as chamas que aqueciam o nosso quarto e desenhei o símbolo da proteção com as suas cinzas no chão.

Procurei rapidamente o meu livro, eu precisava decorar as palavras do encantamento. Escondi um espinho entre meus cabelos, castigando um pouco meu couro cabeludo.

A ultima coisa que eu vi foi as chamas bruxuleantes se aproximando cada vez mais de nossa casa. “Que a Deusa tenha piedade de nós.”

A hora se aproximava.

Eu fechei meus olhos mais uma vez, respirando profundamente, deixando o nada e o silencio tomarem conta de minha mente.

E quando eu os abri, percebi que estava em um ambiente totalmente diferente.

Eu estava acordada.

De súbito eu percebi que era mais um de meus sonhos. Em um momento eu senti tudo aquilo, em outra eu estava ali, de olhos bem abertos, abraçando o meu peito tão forte que eu quase podia sentir minhas costelas se partindo.

Este sonho havia sido tão, tão real, que eu ainda senti a dor em meu peito, a solidão que oprimia a pobre garota, o desespero e desamparo.

Eu havia sentido tudo aquilo pelos meus olhos. Era terrível.

E eu não me recordava de nenhum filme, ou livro com alguma história parecida com aquela para eu ter uma explicação pratica e razoável, para aquele sonho.

Não havia sido como meus pesadelos anteriores.

Mas de alguma forma, a dor pela solidão era pior do que qualquer agressão que eu havia sofrido em meus pesadelos anteriores.

Olhei pata meu rádio relógio e percebi que ele marcava um pouco mais de cinco horas da manhã.

Eu não havia dormido nem três horas completas.

Mas eu queria sair correndo daquela cama e de meu quarto.

Corri para meu banheiro, esperando que a água acalmante de um banho pudesse tirar aquela sensação pesada da minha mente.

Deixei a água morna cair pelo meu corpo, pelos meus cabelos, e o cheiro de meu sabonete e meu shampoo favorito inundarem meus sentidos.

Mas nada disso era suficiente.

Sai às pressas , me enrolando em uma tolha, pensando dolorosamente que em poucas horas eu ainda teria que enfrentar um longo dia na escola

Então, olhando novamente meu relógio, vi que hoje era sábado.

Nada de escola hoje para mim. E eu havia marcado de me encontrar com
Dann a tarde para conversarmos.

Mas ainda era cedo, muito cedo e eu precisava fazer alguma coisa.

Coloquei uma calça de moletom e um abrigo que havia ganhado de meu pai, preto com listras rosa claro da Nike que eu adorava, um tênis, passei os dedos em meus cabelos molhados, e, sem ao menos uma vez olhar no espelho, quiquei escada abaixo.

Tentei tomar o máximo de cuidado para não acordar os meus pais. Eles não precisavam de nenhuma preocupação extra sobre a sanidade de sua única filha.

Escrevi um rápido bilhete e colei no quadro de avisos da cozinha.

“Fui correr na praia. Preciso de exercícios. Volto logo. N”.

Então entrei no meu carro, dei a partida e deixei meus instintos guiarem.

Era uma manhã de sábado, e ainda nem eram seis horas da manhã. Portanto, ruas desertas , livres de carros e pessoas.

O dia começava a raiar, tingindo o céu de laranja e uma infinidade de tonalidades. Mas ainda havia uma brisa fria, fazendo eu me aquecer em meu abrigo.

Eu sabia que praia queria ir. Era um pouco afastada do centro de West Palm, mas ficava a poucas milhas da minha casa.

Em dez minutos eu já estava lá.

Não era uma praia badalada, e era conhecida por ser segura – pois havia dois postos policiais fazendo ronda constantemente – e era a favorita de surfistas, pelas ondas e tranqüilidade.

Eu estacionei o carro próximo a uma grande pedra.

A praia estava vazia, o dia mal estava mostrando os seus primeiros raios de luz e calor.

Eu permaneci um tempo ainda, eu meu carro, pensando em tudo que estava acontecendo, e sentindo aquela horrível solidão que fazia meu peito doer, como se houvesse um buraco dentro cada dele, ficando cada vez maior, e maior...

O espaço dentro do meu carro começou a ficar pequeno e claustrofóbico.

Desci do carro, batendo a porta, e escolhi um lugar na areia para me sentar.

Fiquei ali por algum tempo apenas contemplando o mar,as ondas que se agitavam tocadas pelo vento, a maré subindo, o doce encontro entre o mar e a areia. A praia estava vazia, exceto por alguns pássaros que já haviam despertado e cruzavam o horizonte.

Então eu avistei um surfista solitário ao longe, deslizando suavemente pelas ondas.

Os movimentos do surfista eram hipnóticos, mas algo naquela cena fazia eu me sentir mais solitária. Ou menos, talvez o eco do surfista solitário deslizando pelo mar enquanto o dia ainda mal havia despertado me mostrava que eu não era o único ser solitário naquela manhã.

Ou ao menos , que eu não era a única insone.

A brisa do mar tocava meu rosto como uma carícia. Eu aspirei profundamente e fechei meus olhos.

Quando os abri novamente, percebi que o surfista também havia parado.

Estava sentado em sua prancha, contemplando o oceano, as ondas se quebrando em seu corpo.

Quem era ele? Eu me perguntava.

Talvez ele também fosse jovem. Apesar da distancia, eu apostava que ele não deveria ser muito mais velho do que eu. O que ele fazia ali, contemplando o oceano? Será que também se sentia perdido?

Foi então que ele se jogou na água e nadou em direção a areia, segurando sua prancha com uma das mãos, bem lentamente.

Era rude eu ficar encarando aquele estranho, eu sabia disso. Virei meu rosto e torci para que eu continuasse anônima na praia, longe dos olhos de qualquer pessoa,

O sol já brilhava com força, fazendo meu corpo ficar quente. Tirei meu abrigo, deixando o sol esquentar minha pele através da camiseta de algodão que eu usava por baixo. Corri os dedos pelo meu cabelo, sabendo que eles deveriam estar horríveis devido ao vento e a maresia. Mas eu dei de ombros; Quem me veria naquele estado?

Voltei meus olhos para um bando de pássaros, que faziam um suave baile pelo céu.

Foi então que eu percebi que estava sendo observada.

Olhei apressadamente para frente, quando eu vi que o surfista solitário estava a apenas poucos metros de meu lugar. Ele havia parado e me encarava. Eu foquei meus olhos e aos poucos percebi que ele era sim tão jovem como eu. Havia abaixado sua roupa de borracha até a cintura, deixando seu peito a mostra. Percebi que ele era bonito, o peito e o abdômen definido, vários músculos firmes saltando pelos seus braços.

A medida que sua figura ficava cada vez mais definida, eu senti uma louca vontade de sair correndo dali.

Eu me agitei sentada na areia, pensando se deveria sumir ou continuar ali, sentada. De qualquer maneira ele havia me visto. Ele me fitava e por sua expressão, percebi que ele também tentava decidir se me ignorava ou viria em minha direção.

Os segundos passaram tão lentamente como se fossem horas.

Foi então que ele decidiu. Vi que ele segurava sua prancha com força ao lado de seu corpo e marchava com firmeza em minha direção.

Meu coração batia cada vez mais acelerado, a medida que ele se aproximava.

Oh meu Deus! Oh meu Deus, o que eu faço?

Pois o surfista solitário, não era ninguém menos que Henry Nicolls.

Playlist "As filhas do vento"


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